O autor da PEC, senador Reguffe (PDT-DF), é neto de cearenses: o ex-ministro Expedito Machado, já falecido, e Deise Machado
FOTO: AGÊNCIA SENADO
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Diante da crise de representatividade política no sistema eleitoral brasileiro, tramita no Senado Federal Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que quer garantir ao cidadão a possibilidade de pedir a revogação do mandato de parlamentares e gestores que descumprirem as promessas feitas na campanha. O senador Reguffe (PDT-DF), autor da matéria, argumenta que a intenção é dar autonomia ao eleitor, enquanto cientistas políticos ouvidos pelo Diário do Nordeste ponderam que a prerrogativa fragiliza a democracia.
A PEC 8/2015 está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, o que significa que conseguiu pelo menos 27 assinaturas de parlamentares, um terço do total de cadeiras da Casa. "Durante a campanha eleitoral, os candidatos deverão registrar suas propostas e compromissos de campanha perante a Justiça Eleitoral, que será responsável pela publicação de todo esse material em seus sites oficiais na internet para consulta por todos os eleitores", diz o texto da proposta.
Com base no material publicado na campanha, os candidatos eleitos poderão ser monitorados pela sociedade acerca do cumprimento de promessas. "Eleito o candidato, qualquer eleitor, que tenha votado nele ou não, poderá ajuizar ação de revogabilidade de mandato político perante a Justiça Eleitoral, com fundamento no descumprimento de propostas e compromissos registrados durante a campanha", prossegue a PEC.
Julgamento dos processos
Questionado pelo Diário do Nordeste sobre a efetividade da proposta, o autor da PEC, o senador Reguffe, afirma que visa fortalecer a autonomia do eleitor. "Algumas pessoas defendem a reforma política tendo como eixo o fortalecimento dos partidos. Eu penso diferente, tem que se fortalecer o eleitor", declara. "Uma vez eleito, se contrariar frontalmente um compromisso, ele perderia o mandato. Isso vai fazer com que as pessoas passem a votar menos simplesmente pelos candidatos e mais pelas propostas", alega o senador.
O texto da PEC estabelece prazo de 90 dias para que a Justiça Eleitoral julgue o pedido de revogabilidade dos mandatos. Sobre a viabilidade de se atender à demanda dos processos, que podem atingir quantidade expressiva, Reguffe retruca: "A Justiça Eleitoral julga direito de resposta com rapidez enorme, por que não pode julgar esses pedidos?"
Para o senador, mesmo sem a aprovação da reforma política, a PEC ainda traria impactos significativos ao sistema político-eleitoral. "Muitos candidatos falam muito durante a campanha e não cumprem as propostas (...) As promessas vão cair e o eleitor vai ter a garantia legal do que vai ser cumprido", acredita.
Na justificativa da PEC, o autor da proposta argumenta que "a revogabilidade de mandatos políticos tem sua origem no instituto norte-americano do Recall, introduzido na Carta de Los Angeles por Theodore Roosevel, em 1903". Ele esclarece que a intenção não é transpor a realidade de outro país à democracia brasileira. "Lá (Estados Unidos) pode convocar nova eleição, aqui vai ser exigido que compromissos sejam registrados", diz.
Além da proposta de revogação de mandatos, o senador Reguffe diz que já assinou outras quatro PECs sobre a reforma política. Nas demais matérias, defende o fim da reeleição para cargos executivos, limite de uma única reeleição para o Legislativo, voto facultativo, voto distrital, candidaturas avulsas sem filiação partidária e a proibição de que um candidato eleito para o Legislativo vá para o Executivo, como secretários de governo e ministros que saem do parlamento.
Na opinião do cientista político Horário Frota, coordenador do mestrado de Políticas Públicas da Universidade Estadual do Ceará, a PEC não traz resultados impactantes ao sistema eleitoral. "Sem a reforma política, a proposta fica inócua, tem mais efeito eleitoral do que qualquer outra coisa. Se tivesse a eleição distrital, teria controle mais próximo (do eleitor)", expõe. "Sem ter eleição com número reduzido de candidatos por zona, cada cidadão teria que acompanhar muitos candidatos", completa.
Crises
O docente pondera que existem fenômenos externos que podem dificultar cumprimento de promessas dos candidatos eleitos, como crises econômicas nacionais e internacionais. "Essa proposta é só uma forma de escamotear o problema real da representação e do financiamento".
O professor Osmar de Sá Ponte, do departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará, avalia que proposta dessa natureza pode gerar instabilidade na democracia brasileira, além do risco de ser usada de forma oportunista por políticos adversários. "O Brasil vive numa crise política e uma proposta dessa pode ser entendida como tentativa de golpe", analisa. "Isso vai abrir espaço para conflito de legitimidade que pode aprofundar a crise e transformaria numa crise institucional muito grave".
Osmar Ponte sugere o controle social como alternativa para reforçar a participação popular nas decisões políticas. "O controle social precisa amadurecer cada vez mais. Desde a Constituinte de 88, temos meios que favorecem participação popular, controle social e acompanhamento da execução orçamentária".
Para o professor, o desvio de verba pública é um imbróglio no poder público, mas pondera que a solução mais adequada não é uma proposta que garante a revogabilidade dos mandatos políticos. "A corrupção não é só um desafio moral, é ético. O Brasil precisa gastar bem senão perde a oportunidade de se tornar uma potência econômica em função da sua importância estratégica. Essa PEC não é solução, é retornar o país da década de 50 para trás na ideia de encontrar salvadores da pátria", pontua.
Lorena Alves
Repórter
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