Rio/Fortaleza. Após intensas negociações em 2014, o
mercado de telecomunicações deve ter seu redesenho definido neste ano.
Espera-se que o País passe a ter três, em vez de quatro, grandes
operadoras. Com menos guerras de preços e maior lentidão nos
investimentos para melhoria da qualidade, o consumidor pode acabar
pagando a conta, num quadro em que os serviços de telecomunicações
caminham para encerrar 2014 como campeões absolutos de reclamações nos
Procons.
Dados recentes mostram que assuntos relacionados à telefonia fixa (9,7%
do total de demandas) e celular (9,2% do total) lideram o ranking do
Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec), do
Ministério da Justiça, formado com informações de Procons de 424
cidades. Juntos, os serviços somam 382 mil reclamações de janeiro a
outubro de 2014.
Prejudicial ao consumidor
Para a advogada Flávia Lefèvre, conselheira da Associação de
Consumidores Proteste, especializada no setor de telefonia, os
movimentos de fusões e aquisições são prejudiciais para os consumidores
porque fortalecem a verticalização dos serviços, com as operadoras
oferecendo vários produtos - telefone fixo, móvel, internet, TV por
assinatura.
A concentração de mercado, na opinião da advogada, ainda alivia exigências de investimentos por parte das empresas.
"O foco dos problemas é a falta de infraestrutura", afirma Flávia. O
resultado são serviços caros e de má qualidade, de acordo com Flávia.
Venda da TIM
O mercado pode ficar mais concentrado porque uma das quatro grandes
operadoras do País pode desaparecer. Atualmente, há dois cenários mais
prováveis: o fatiamento da TIM entre as concorrentes (Oi, Claro e Vivo)
ou a fusão da companhia controlada pela Telecom Itália com a brasileira
Oi.
A TIM detém a segunda maior fatia do mercado de telefonia móvel no País
(26,83%) - atrás da Vivo (28,61%) - e, no Ceará, é a líder (35,16%) -
disputando espaço com a Oi (33,08%). Assim, o primeiro cenário provável
para o futuro da operadora implica em uma liderança da Vivo, detentora
de apenas 5% do mercado local e apontada como principal beneficiada com o
fatiamento da TIM no Ceará, o que implica em uma continuação da disputa
com a Oi. Já o segundo desenho traria uma hegemonia ao mercado
cearense, pois a aquisição da TIM daria à Oi a liderança local com mais
de 50% da telefonia móvel no Ceará.
A Telecom Itália já sinalizou que não tem interesse de abrir mão
facilmente das operações no País, embora não descarte a venda da TIM, se
a oferta for atrativa. Analistas ouvidos afirmam que o protagonismo na
consolidação pode fazer mais sentido para a TIM.
Isso porque a Oi está fragilizada, com uma dívida que somava cerca de
R$ 48 bilhões no fim do terceiro trimestre. Para poder participar melhor
das negociações no mercado nacional, a tele brasileira está em processo
de venda dos ativos da Portugal Telecom (PT) - assunto que deve ser
discutido hoje por acionistas da operadora portuguesa.
Concorrência e equilíbrio
Na avaliação do consultor Eduardo Tude, diretor da empresa de
consultoria Teleco, é possível manter a concorrência mesmo com apenas
três operadoras atuando no mercado brasileiro. "Se você tem dois players
com 80% de mercado e um terceiro com o restante, é quase um duopólio.
Agora, se tem os três com participações equilibradas, é outra situação",
afirma Tude.
Segundo o ex-ministro das Comunicações e sócio da Órion Consultores,
Juarez Quadros, com menos empresas, o mercado pode ganhar sinergias e
obter vantagem competitiva para melhorar a qualidade. "Mas se isso não
for feito com muito cuidado, o consumidor pode ser prejudicado", observa
Quadros.
Crédito a operadoras deverá ficar estável, diz BNDES
Rio. O resultado do leilão de concessão para 4G na
faixa dos 700 MHz e as negociações envolvendo o controle da Oi e da TIM
esfriaram o ritmo de investimentos no setor de telecomunicações. Após
fechar 2014 com desembolsos de R$ 3,2 bilhões para empréstimos já
aprovados para as grandes operadoras, o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) projeta repetir o valor em
2015. Em agosto do ano passado, a projeção era mais otimista. A intenção
era liberar R$ 4,15 bilhões em 2015.
Os desembolsos do BNDES para o setor de telecomunicações costumam ser
cíclicos. Em geral, cada uma das grandes operadoras vai ao banco de
fomento de três em três anos, para financiar parte dos planos de
investimentos. Os recursos liberados agora se referem, portanto, a
projetos aprovados nos anos anteriores.
A última companhia a ter um empréstimo do tipo liberado foi a TIM, em
dezembro de 2013. No ano passado, nenhum plano de investimentos foi
apresentado ao BNDES e, em 2015, o quadro deverá se repetir. "Não temos a
expectativa de que nos entreguem um novo plano", diz a chefe do
Departamento de Tecnologia da Informação e Comunicação do banco, Irece
Kauss.
O resultado do leilão de 4G atrasa os investimentos porque o valor de
outorga ficou muito elevado. "Primeiro, as empresas terão de digerir as
outorgas. O esforço dos diretores financeiros no primeiro semestre será
se financiar para dar conta desse investimento", afirma Irece, lembrando
que o banco de fomento não pode financiar o investimento nas outorgas.
Influências
Embora atrapalhe o ritmo de investimentos, esse fator é previsível,
destaca a executiva do BNDES, pois o esforço financeiro das empresas com
a taxa paga ao governo é possível de ser calculado. Já o outro fator a
atrasar investimentos, o troca-troca de sócios na composição de capital
das operadoras, tende a ser muito mais incerto. "Os movimentos
societários não sabemos quanto tempo podem durar", fala Irece.
Mesmo com a moderação nos desembolsos em 2015 em relação ao ano anterior, o nível de recursos liberados permanece elevado.
Regulação ainda é considerada falha
Rio. Com mais ou menos concorrência, qualidade nos
serviços e preços justos no mercado de telecomunicações são itens que
dependem da regulação. No Brasil, essa história começou com a
privatização das empresas estatais que operavam os serviços de
telecomunicações, no fim dos anos 1990.
Atualmente, falhas na regulação são apontadas tanto por empresas quanto
por entidades de defesa dos consumidores. Para a advogada Flávia
Lefèvre, conselheira da Associação Proteste, especializada no setor de
telefonia, um grande problema da regulação brasileira é não incluir os
serviços de internet de banda larga no sistema de concessão pública, e
sim no rol dos serviços privados. Assim, as exigências e metas de
universalização são mais leves e a infraestrutura física não é
considerada reversível nos contratos - não volta para o governo ao fim
da concessão.
Distorção
Já o conselheiro da Anatel Igor de Freitas avalia que há atualmente
"excesso" e "certa distorção do conjunto de regras" impostas às
empresas.
Freitas aponta que um dos problemas diz respeito justamente à
reversibilidade, aplicável nos serviços prestados sob o sistema de
concessão, como telefonia fixa, como é o caso da Oi e da Telefônica.
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