sexta-feira, 30 de maio de 2014

De volta ao disco, após cinco anos, o músico cearense reúne antigos parceiros e regrava Belchior

Nos bastidores do estúdio de gravação Ararena, em Fortaleza, há alguns anos que, vez por outra, topava-se com Raimundo Fagner - um dos sócios, ao lado dos músicos Humberto Pinho e Amaro Penna - gravando novas canções. Mas disco, que é bom, não saía. Saiu. Esta semana, cinco anos após o lançamento de seu último álbum de inéditas ("Uma canção para o rádio", de 2009), o intérprete e compositor cearense está de volta com "Pássaros Urbanos", lançado pela Sony Music e já disponível em plataformas digitais como iTunes e Deezer.

"De primeiro, a gente tinha compromisso de lançar disco, ficava sob contrato de quatro anos, lançando um por ano. Hoje mudou muito. Você espera o momento adequado", justifica o cantor, em entrevista por telefone, concedida de sua cidade natal, Orós.
A espera é recompensada por um Fagner em plena potência poética, visceral, regado a paixões arrebatadoras e desilusões. Mergulha num cancioneiro de amor rasgado, que marca alguns dos bons compositores de sua geração. Para isso, estão de volta, também, parceiros como Fausto Nilo - que assinava apenas uma das letras de "Uma Canção no Rádio" - respondendo por quatro faixas do novo álbum, além da arte da capa do CD.
O piauiense Clodo Ferreira (autor de "Revelação") dividiu a faixa de abertura com Fagner; Michael Sullivan, (que tem entre os maiores sucessos, "Deslizes", na voz de Fagner) é também o produtor musical do disco e aproveita para incluir duas novas composições no álbum. Entre os parceiros está também Zeca Baleiro, que faz, ainda, participação especial em dueto.
Canções
"Pássaros Urbanos" traz 11 faixas - duas regravações são regravações. A essência musical do compositor vem estampada já na abertura, a começar pelos violões de "Se o amor vier", com traços das sonoridades árabes e ibéricas. São marcas pessoais de Fagner e elementos que remetem à própria cultura nordestina. Em dueto, nas cordas, Cainã Cavalcante, no violão de nylon, e Cristiano Pinho, nylon, aço e guitarra. A composição, de Fagner com Clodo Ferreira, foi o ponto de partida para todo o álbum.
"Gravamos no estúdio Ararena, em Fortaleza. Tem música desse disco que está pronta há dois anos. Ano passado, juntamos o material e fomos para Rio de Janeiro, gravar com o Sullivan. Foi quando distribui arranjos para outras pessoas", relembra Fagner.
"Pássaros Urbanos" chega na sequência assinada por Fausto Nilo, em parceria com Cristiano Pinho. Mais conhecido por seu trabalho como instrumentista, que há muito acompanha Fagner, Pinho vem reforçando essa verve criativa - já registrada nos solos "Pessoa" (1997) e "Cortejo" (2009) - e que rendeu pérolas como "Relógio do Mundo", ainda inédita. O guitarrista dividiu com o arranjo com o dono da bola.
O poeta e arquiteto - que canta seus improvisos na voz dos amigos - assina ainda os versos de "Arranha Céu", arranjada por Sullivan, e "Versos Ardentes", com o próprio Fagner. Dois cantos rasgados de saudade ("essa cachorra", esbraveja em "Arranha Céu"), de sofreguidão, bem ao estilo da vertente do cancioneiro cearense que o cantor se fez porta-voz. Duas pérolas do disco que devem agradar os fãs antigos. Detalhe para a participação da Yahoo, em "Versos Ardentes". Sucesso no fim dos anos 80, a banda tinha Robertinho de Recife nas guitarras.
Fagner e Fausto ainda dividem a canção que encerro o disco, "Balada Fingida", faixa marcada por uma tristeza suave. A redenção, talvez, do apaixonado, liberto pela experiência. "Se o tempo perguntar por mim / Diga que eu falei/ Que não volto mais/ Diga que perdi o trem/ Procurando alguém / Há tempos atrás", despista as mágoas.
Baleiro assina "Toda Luz", canção abolerada, de guitarras distorcidas, e "Samba Nordestino", esta, cantada por ele, em dueto com Fagner. Fazendo jus ao título, agregam ao samba toques do maracatu, detalhes de sanfona. O samba, homenagem aos compositores nordestinos, cantando um pouco do Ceará, Sergipe, Alagoas e lembrando nomes como os de Gordurinha, Jackson do Pandeiro, Lauro Maia, Dominguinhos e o próprio Fausto Nilo.
Regravações
O novo disco traz apenas duas versões. O sucesso "No Ceará É Assim", canção do início dos anos 1940, de Carlos Barroso, já gravada por Fagner no álbum "Pedras que Cantam" (1991). A de 2014, no entanto, destoa do restando do álbum. O arranjo "exaltação", como define o cantor, soa um pouco piegas, descolado do se ouve no restante do álbum. Segundo o cantor, a faixa entrou no disco aproveitando o contexto em que se daria o lançamento, próximo à Copa do Mundo da Fifa. Vale lembrar que sua gravadora, a Sony Music, ser a "gravadora oficial" do evento.
"A música tem um pouco esse viés do turismo. Eu retomei porque muitos jornalistas da imprensa internacional, quando me entrevistavam, falavam nessa canção. E temos poucas músicas sobre Ceará. A outra gravação era mais chorada. Essa fizemos, por esse contexto, com clima de exaltação", justifica.
A outra versão é um precioso e inédito registro de "Paralelas", de Belchior. Apesar de cantadas e pedida em shows, nunca havia sido gravada por Fagner. "Tem poucos registros dessa música. Além de eu gostar, é também uma forma de homenagear o Belchior, um parceiro que está sumido. De alguma forma, pode ser que, se ele escutar, dê saudade da gente", avisa.
E os fãs de Fagner podem se preparar para mais novidades. Ainda este ano, sairá a reedição de toda a discografia do cantor, pela Sony Music. O cantor comemorou, em 2013, 40 anos de carreira e possui mais de 30 discos. Além de compor uma caixa com a obra completa, os discos voltarão a catálogo para venda avulsa. Em julho, o cantor entra em estúdio para a preparação de um novo CD, todo em parceria com o paraibano Zé Ramalho.
Disco
Pássaros Urbanos
Fagner
Sony Music
2014, 11 faixas
R$ 24,90
Fábio Marques
Repórter

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