Em 2000, a estimativa era de dez pessoas para cada carro; especialistas sugerem a ções para melhorar o tráfego
A tarefa de ser uma cidade sustentável que proporcione mobilidade
urbana de forma integrada, rápida e sem transtornos para a população de
2,5 milhões de pessoas é um dos grandes desafios de Fortaleza. Para
especialistas, meta essa ainda muito distante de ser alcançada, se
observada a velocidade com que a frota de carros particulares aumenta em
relação à população. Para cada cinco habitantes, a capital cearense já
tem um automóvel. No ano 2000, a proporção era de dez pessoas para um.
Em dez anos, entre 2003 e 2013, enquanto a população de Fortaleza
aumentou 21,4% - de 2,1 milhões para 2,5 milhões - a frota de carros
particulares saltou 78,1% - de 284,2 para 506,3 mil. Nesse período, a
média era de 7,3 pessoas por veículo.
Avanço
De acordo com dados do Departamento Estadual de Trânsito no Ceará
(Detran/CE) referentes a dezembro de 2013, com a frota de 506,3 mil
carros particulares, se todos circularem no mesmo momento, é possível
transportar 100% população nesse tipo de veículo. Segundo o órgão, os
dados estatísticos levam em conta a divisão do número da frota de
automóveis pela população em geral, mas, é claro, aponta o economista
Pedro Souza, vários fortalezenses têm mais de um carro, e grande parcela
não tem nenhum. "E não teríamos vias suficientes para dar conta disso",
diz.
Na avaliação do coordenador do Núcleo de Atuação Especial de Controle,
Fiscalização e Acompanhamento de Políticas do Trânsito (Naetran) do
Ministério Público Estadual (MPE), Gilvan Melo, a frota de veículos em
si não é motivo para o caos que enfrentamos todos os dias. Para ele, a
falta de planejamento estratégico tanto da infraestrutura urbana quanto
da fiscalização contribui quase 100% para os transtornos. "É um descaso
total, aliado aos motoristas que não respeitam nem a si mesmos e essas
obras sem fim", aponta.
A Prefeitura de Fortaleza promete melhorias na mobilidade quando as
intervenções em túneis, viadutos e obras do Programa de Transporte
Urbano de Fortaleza (Transfor) e as voltadas para a Copa do Mundo
estiverem concluídas. Para o especialista em Psicologia Clínica e do
Trânsito, José Wagner de Paiva, campanhas de conscientização também
devem ser realizadas com mais frequência. "Não podemos nos esquecer que o
condutor é quem está no volante e depende dele o respeito às leis do
trânsito para evitar tantos acidentes absurdos. É preciso também
conscientizar o ciclista e pedestre", frisa.
A arquiteta e urbanista Mariana Carvalho não tem dúvidas: "chegamos
numa encruzilhada. Ou se começa a investir no transporte público de
qualidade ou o colapso nas grandes cidades é iminente", analisa.
Ela questiona: "olhe em volta, observe a rua. O que você vê?". E
responde: o espaço das ruas, que chamamos de espaço público, está
ocupado por carros. Os transportes públicos, calçadas e ciclovias,
juntos, somam menos de 10% deste espaço. "Vivemos uma crise de
mobilidade com aumento dos congestionamentos, da poluição atmosférica,
das mortes no trânsito e do tempo que gastamos para o deslocamento, nos
carros ou nos ônibus", analisa.
Para ela, a infraestrutura viária é fator determinante do planejamento
físico e territorial, e com a pressão exercida pelo crescimento
vertiginoso da frota de automóveis, grande parte do investimento público
é destinado a este modo de transporte privado. "Precisamos saber
priorizar o coletivo", defende.
Investimentos
A engenheira de transportes da Universidade Federal do Ceará (UFC),
Nadja Dutra, defende mais investimentos em veículos não motorizados como
uma das alternativas mais viáveis e de curto prazo no sentido de
melhorar a mobilidade urbana em Fortaleza. Para ela, os
congestionamentos e a crescente demanda de tráfego nas grandes cidades e
regiões metropolitanas passaram de uma questão de segundo plano para
converter-se em um dos principais problemas para os habitantes das áreas
urbanas.
Usuários do transporte público também reclamam. "Não está fácil para
ninguém circular por Fortaleza. Nem para o motorista, ciclista,
passageiro e muito menos para o pedestre", pontua o professor Júlio José
Ventura.
47% da frota possuem até cinco anos
47% da frota possuem até cinco anos
Além de aumentar em ritmo maior do que o número de habitantes, a frota
de veículos da Capital também está se rejuvenescendo, embora em ritmo
lento. De acordo com os dados, 48% dos veículos, ou 458,5 mil, têm até
cinco anos de uso. Outros 155,6 mil, ou 22% do total, possuem entre
cinco e dez anos.
O Detran também aponta que 98,6 mil veículos têm entre dez e 15 anos de uso e 188,1 mil possuem mais de 15 anos.
De acordo com estudo do Observatório das Metrópoles, o crescimento da
frota de veículos é um fenômeno que vem sendo notado há alguns anos em
todo o País e é resultado de três fatores: aumento da renda da população
(especialmente da classe C), reduções fiscais do governo federal e
facilidades de crédito promovidas pelos bancos.
Malha
"Entretanto, a infraestrutura viária e equipamentos de controle não
acompanham crescimento do número de carros", indica o sociólogo Jeremias
Andrade. Além disso, continua, o sistema de transporte público ainda é
ineficiente, aliado à falta de política para os ciclistas.
As ciclovias, aponta, são desconectadas e mal projetadas. "Ainda
enfrentamos a ausência de uma política de educação do trânsito que possa
proteger pedestres e ciclistas, as maiores vítimas de um tráfego
violento que vitima muitos por dia, deixando sequelas quase
insuperáveis", lamenta ele.
Dobro
Em dez anos, entre 2003 e 2013, a frota total de veículos de Fortaleza
mais do que dobrou, passou de 422,4 mil para 900,9 mil até dezembro do
ano passado. Por mês, aponta o Detran-CE, são implantados uma média de
6,5 mil novos veículos somente na Capital. No Estado, o número geral dos
veículos chegou a 2,3 milhões em dezembro.
Estatísticas da Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e de
Cidadania (AMC) constatam um cenário de estresse e violência diária no
trânsito da Capital: até setembro de 2013, 15 mil acidentes foram
registrados na cidade, com 61 mortes e outros 5,5 mil feridos. A maior
parte das ocorrências tem a imprudência como a principal causa, apontam
os especialistas em trânsito. Em nove meses de 2013, foram 8,2 mil
colisões envolvendo carros, motos, ônibus e caminhões. Desse total, 5,4
mil feridos e 30 mortes.
Lêda gonçalvesRepórter
Nenhum comentário:
Postar um comentário