Filhos de catadores de material reciclável criam instrumentos e formam bandas de lata na Capital e no Interior
Crianças e adolescentes filhos de catadores em Fortaleza, Russas e Limoeiro participam do projeto Catando Cidadania. Os instrumentos são fabricados de material encontrado no lixo e bandas de lata animam as comunidades. fotos: divulgação
Limoeiro do Norte. A máxima de que na natureza tudo se transforma é o mínimo que podem fazer famílias que cuidam da vida catando o que é descartado. Com material jogado nos lixões, filhos de catadores criam instrumentos de percussão e tocam música. De uma forma lúdica e divertida, crianças "problemáticas", na verdade em vulnerabilidade social, conhecem o trabalho dos pais e, assim como eles, são incluídos socialmente por meio da educação. A ação faz parte do projeto Catando Cidadania, desenvolvido na Capital e em municípios do Interior.
Não há intenção de formar músicos. Os meninos tocam, sim, até música compõem para darem ritmo às batidas. O som é "bom", conforme atestam as comunidades. Mas quando crianças como Ramon Pereira Damasceno, de nove anos, pegam um pedaço de lata e têm a chance de transformar num instrumento que vai dar ritmo, tocam de outro jeito a própria vida. Em várias batidas, literalmente, sérios problemas como trabalho infantil, consumo de drogas e a miséria quase absoluta são denunciados e, assim, inicialmente combatidos pela ação lúdica.Crianças e adolescentes filhos de catadores em Fortaleza, Russas e Limoeiro participam do projeto Catando Cidadania. Os instrumentos são fabricados de material encontrado no lixo e bandas de lata animam as comunidades. fotos: divulgação
Limoeiro do Norte. A máxima de que na natureza tudo se transforma é o mínimo que podem fazer famílias que cuidam da vida catando o que é descartado. Com material jogado nos lixões, filhos de catadores criam instrumentos de percussão e tocam música. De uma forma lúdica e divertida, crianças "problemáticas", na verdade em vulnerabilidade social, conhecem o trabalho dos pais e, assim como eles, são incluídos socialmente por meio da educação. A ação faz parte do projeto Catando Cidadania, desenvolvido na Capital e em municípios do Interior.
Praticamente todos os irmãos de Ramon sofrem de algum tipo de envolvimento com as drogas. A família não é pobre, é miserável. Os pais passam o dia catando lixo. A banda de lata é o que há de comum entre eles. Enquanto os pais catam para gerar renda e alimentar Ramon e os irmãos, o menino transforma o material catado em batidas. Perdeu mais a timidez, deixou de ser "agitado" e, paradoxalmente, está reciclando parte da sua energia de criança.
Mobilização
Em Fortaleza e nos municípios de Limoeiro e Russas, no Vale do Jaguaribe, o projeto Catando Cidadania está provocando a mobilização de famílias que trabalham nos lixões. Em miúdos, as "bandas de lata" estão ajudando não só a conhecer melhor as famílias de catadores como criando a consciência dos grupos sobre os seus direito sociais.
Em Limoeiro e Russas são aproximadamente 50 crianças atendidas pelo projeto. Entre janeiro e março foram desenvolvidas várias oficinas de percussão. A meninada é convocada para usar "bombonas" (um tipo de botijão grande de plástico), latas vazias de leite, cabos de vassoura, até milho seco e o que mais possa trazer um som.
"Desde 2008 viemos trabalhando com filhos e filhas de catadores por meio do projeto Catando Cidadania. É uma forma de se aproximar das comunidades que trabalham nos lixões e galpões de reciclagem e entender as várias fragilidades", afirma Regilvânia Matheus, integrante da Cáritas Diocesana.
Em que ajudam essas bandas de lata? "Muda o comportamento. O Fabrício não ficava quieto. Visitamos a família e percebemos que era uma realidade doméstica muito difícil. Quando disseram que não adiantava chamar alguns meninos não ouvimos e percebemos que o que eles mereciam era um pouco de atenção", explica Maria da Conceição de Almeida, coordenadora pastoral e voluntária da Cáritas em Fortaleza.
O garoto Cheryton Lucas, de 12 anos, toca em tambor de plástico na banda de lata formada pelos amigos e chamada criativamente de "Pracatá". A irmã mais nova toca também. Até a mãe participa. "Sou voluntária, acompanho os meus filhos, os outros meninos da comunidade e ajudo a confeccionar os instrumentos, mas aí tinha grande demais para os meninos segurarem então eu acabei participando da banda também", comenta a catadora Charliane Bezerra.
As bandas de lata no projeto Catando Cidadania, desenvolvido pela Cáritas em comunidades de catadores de material reciclável. Outras ação desenvolvida é a terapia comunitária. Lideranças sociais são capacitadas e elas próprias desenvolvem as reuniões com as famílias de catadores. É aí que problemas de vulnerabilidade social são evidenciados. Feito os tambores de lata, o silêncio dos oprimidos é rompido. Violência doméstica, trabalho infantil, drogas e abuso sexual são colocados na roda pela própria comunidade. Outro passo durante o ano serão as oficinas de arte e educação, tendo como enfoque o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). "A culminância desse projeto vai ser a elaboração, junto com catadores e até mesmo as próprias crianças e adolescentes, de um Plano de Desenvolvimento Local, que dali aponte as demandas das comunidades e sirva de instrumento de pressão política e mobilização social", explica Regilvânia Matheus.
Os catadores do Ceará tem feito a crescer a mobilização social da categoria, que no ano passado realizou três marchas regionais, incluindo a estadual em Fortaleza, para reclamar a construção de aterros e, especialmente, a coleta seletiva.
"Se todas as residências separassem o que é reciclável do que não é, nós não trabalharíamos no lixão e sim nas ruas, e isso teria muito mais dignidade", afirma Maria Rubens Saldanha, a "Pedinha", presidente da Associação dos Catadores e Catadoras de Limoeiro do Norte.
Após quatro etapas de capacitação, foi um sucesso o encerramento das oficinas das bandas de lata em Limoeiro e Russas. Sucesso porque chamou mais gente da comunidade do que se era esperado.
Ainda mais porque quando acabou, quem não levou instrumentos para casa pegou as panelas de casa para "treinar". Claro, sem muito barulho para a mãe não brigar. Até diploma os meninos receberam.
Em Limoeiro, o Catando Cidadania tem a parceria do Projeto Paz e União, sediado no Bairro Antônio Holanda, a popular "cidade alta". É lá que mora a maioria dos catadores de material reciclável, que eles pedem para enfatizar que não é o mesmo que catador de lixo.
"O que nós catamos é o nosso sustento, é aquilo que outras pessoas vão poder reaproveitar dentro das próprias casas", explica a catadora-presidente "Pedinha". Enquanto os pais catam com a mão o sustento de casa, os filhos batem com as mãos e encontram sons e, dessa forma, cidadania.
Prefeituras atrasadas na criação de aterros
Fortaleza. Não é fácil a situação dos catadores de material reciclável no Ceará. Porque há um universo de lixões (mais de 284) e pouquíssimos aterros sanitários (oito). Trabalham o dia inteiro no meio do sol e sujeito às mais variadas doenças. Fedentina é o de menos. Hoje mais mobilizados socialmente, grupos em todo o Estado pedem coleta seletiva e que os aterros sanitários saiam dos discursos para a prática dos gestores públicos.
Além de trabalhar o dia inteiro sem equipamentos de proteção (e mesmo quando têm não suportam por trabalharem ao sol), os catadores vez por outra são contaminados por algum mal despejado pelos carros do lixo. Pode ser uma seringa hospitalar ou um animal morto e cheio de bactérias que causam doenças infecto-contagiosas.
Em 2010, havia em todo o Estado 236 lixões nos municípios. Resíduos sólidos jogados de qualquer jeito. Mas em municípios como Quixeré, no Vale do Jaguaribe, até resíduos de fossas domésticas são despejados no lixão, o que dificulta ainda mais o trabalho dos catadores.
De tanto ouvirem de prefeitos em todas as microrregiões do Estado, de que seriam instalados aterros sanitários, os catadores cansaram das promessas. Desde o ano passado realizam marchas pedindo a coleta seletiva.
"A gente entende que já que ainda não saiu aterro sanitário nenhum, que ao menos o material que pode ser coletado seja separado nas próprias casas, pois evitaria a gente de vir para cá", afirma Maria Rubens, presidente da Associação de Catadores de Limoeiro.
Mas neste mesmo município já houve recurso para a construção de aterro. Ninguém sabe é onde explicar para onde foi parar. No ano de 2009 o Tribunal de Contas da União julgou e condenou o ex-prefeito José Oliveira Bandeira (falecido em 2010) por não conseguir esclarecer onde foram aplicados R$ 421 mil recebidos, mas não usados na instalação de um aterro sanitário para o município.
Mais de 90% dos municípios brasileiros têm lixões no lugar de aterros sanitários. Na teoria, no ano que vem não deveria existir mais lixões, até que em 2014 todo município tenha seu aterro sanitário. A política Nacional dos Resíduos Sólidos (instituída em 2010) proíbe a criação de lixões e determina que até o fim deste ano todos os municípios tenham providenciado suas licenças ambientais para construção de aterros sanitários. Mas até agora nem 10% dos municípios tomaram essa providência.
Fortaleza. Não é fácil a situação dos catadores de material reciclável no Ceará. Porque há um universo de lixões (mais de 284) e pouquíssimos aterros sanitários (oito). Trabalham o dia inteiro no meio do sol e sujeito às mais variadas doenças. Fedentina é o de menos. Hoje mais mobilizados socialmente, grupos em todo o Estado pedem coleta seletiva e que os aterros sanitários saiam dos discursos para a prática dos gestores públicos.
Além de trabalhar o dia inteiro sem equipamentos de proteção (e mesmo quando têm não suportam por trabalharem ao sol), os catadores vez por outra são contaminados por algum mal despejado pelos carros do lixo. Pode ser uma seringa hospitalar ou um animal morto e cheio de bactérias que causam doenças infecto-contagiosas.
Em 2010, havia em todo o Estado 236 lixões nos municípios. Resíduos sólidos jogados de qualquer jeito. Mas em municípios como Quixeré, no Vale do Jaguaribe, até resíduos de fossas domésticas são despejados no lixão, o que dificulta ainda mais o trabalho dos catadores.
De tanto ouvirem de prefeitos em todas as microrregiões do Estado, de que seriam instalados aterros sanitários, os catadores cansaram das promessas. Desde o ano passado realizam marchas pedindo a coleta seletiva.
"A gente entende que já que ainda não saiu aterro sanitário nenhum, que ao menos o material que pode ser coletado seja separado nas próprias casas, pois evitaria a gente de vir para cá", afirma Maria Rubens, presidente da Associação de Catadores de Limoeiro.
Mas neste mesmo município já houve recurso para a construção de aterro. Ninguém sabe é onde explicar para onde foi parar. No ano de 2009 o Tribunal de Contas da União julgou e condenou o ex-prefeito José Oliveira Bandeira (falecido em 2010) por não conseguir esclarecer onde foram aplicados R$ 421 mil recebidos, mas não usados na instalação de um aterro sanitário para o município.
Mais de 90% dos municípios brasileiros têm lixões no lugar de aterros sanitários. Na teoria, no ano que vem não deveria existir mais lixões, até que em 2014 todo município tenha seu aterro sanitário. A política Nacional dos Resíduos Sólidos (instituída em 2010) proíbe a criação de lixões e determina que até o fim deste ano todos os municípios tenham providenciado suas licenças ambientais para construção de aterros sanitários. Mas até agora nem 10% dos municípios tomaram essa providência.
Mais informações:Projeto Catando Cidadania
Cáritas Diocesana Ceará
(85) 3388-8716
(85)9934-3903 (Regilvânia Matheus)
Cáritas Diocesana Ceará
(85) 3388-8716
(85)9934-3903 (Regilvânia Matheus)
MELQUÍADES JÚNIORREPÓRTER
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