A presidiária Maria Rosilene de Lima, 30, reclusa há um ano e meio por assalto a mão armada e cursando a alfabetização, se emocionou ao escrever a sua primeira carta FOTO: RODRIGO CARVALHO |
Pesquisa indica que o Estado tem o segundo maior índice do País de presos estudando, atrás apenas de Pernambuco
"Cheguei aqui sem saber escrever o meu nome. Eu era moradora de rua e viciada em crack. Na vida, não tive chances de sentar em um banco de escola. Ontem, depois de um ano cursando a alfabetização, eu escrevi a minha primeira carta. Meus filhos agora vão conhecer a minha letra", conta, emocionada, a detenta Maria Rosilene de Lima, 30 anos, que há um ano e seis meses está reclusa no Instituto Penal Feminino Desembargador Auri Moura Costa, no município de Itaitinga. Condenada a oito anos de detenção por assalto a mão armada, mãe de três filhos que, atualmente, moram com o pai, o qual nunca deixou as crianças visitá-la na penitenciária, ela diz que o seu maior sonho era poder escrever com o próprio punho uma carta para os filhos. "A educação é tudo na vida de uma pessoa. Quando venho para a escola, me sinto livre. Hoje, não preciso mais me humilhar, pedindo a alguém para escrever por mim", destaca Rosilene.
De acordo com um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes a partir de dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) de Dezembro de 2010, o Ceará é o segundo Estado do Brasil em números percentuais de detentos estudando.
De acordo com a pesquisa, havia, até o fim do ano passado, 15.201 presidiários. Deste total, 15,6%, ou seja, 2.523 presos estudam. Em primeiro lugar no levantamento, está Pernambuco, pois, de um total de 23.925 presos, 16,5% estudam.
Em termos percentuais, os Estados ficam à frente de São Paulo, com 8,8%, Rio de Janeiro, com a mesma porcentagem, e Paraná, com 8,7%.
Mas, apesar do Ceará estar em uma boa classificação, muitas lacunas ainda devem ser preenchidas. No último dia 3 de outubro, iniciou o prazo de inscrições para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para presos ou jovens que cumprem medidas socioeducativas com privação de liberdade.
Porém, a inscrições, que vão até o dia 17 de outubro, não devem apresentar uma lista extensa de candidatos, já que, segundo dados da Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado do Ceará (Sejus), atualmente, no Estado, dos 16. 222 detentos, 2.405 estudam, ou seja 14,8%. Contudo, apenas 224 estão no Ensino Médio, e não há informações de quantos estão aptos a realizar o teste. Ainda de acordo com a assessoria de imprensa do órgão, apenas um detento no Ceará realizou o Enem no ano passado.
Nas 14 unidades do Estado que mantêm jovens de 12 a 18 anos cumprindo medidas socioeducativas, a realidade não é muito diferente. Dos 961 adolescentes que estudam, 200 estariam aptos por idade a fazer o teste, porém, apenas 25 têm nível educacional para prestar o exame. No entanto, não se sabe quantos irão fazer.
Na visita feita pela equipe do Diário do Nordeste ao presídio Auri Moura Costa, encontramos apenas duas detentas que vão fazer o Enem.
"Cheguei aqui sem saber escrever o meu nome. Eu era moradora de rua e viciada em crack. Na vida, não tive chances de sentar em um banco de escola. Ontem, depois de um ano cursando a alfabetização, eu escrevi a minha primeira carta. Meus filhos agora vão conhecer a minha letra", conta, emocionada, a detenta Maria Rosilene de Lima, 30 anos, que há um ano e seis meses está reclusa no Instituto Penal Feminino Desembargador Auri Moura Costa, no município de Itaitinga. Condenada a oito anos de detenção por assalto a mão armada, mãe de três filhos que, atualmente, moram com o pai, o qual nunca deixou as crianças visitá-la na penitenciária, ela diz que o seu maior sonho era poder escrever com o próprio punho uma carta para os filhos. "A educação é tudo na vida de uma pessoa. Quando venho para a escola, me sinto livre. Hoje, não preciso mais me humilhar, pedindo a alguém para escrever por mim", destaca Rosilene.
De acordo com um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes a partir de dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) de Dezembro de 2010, o Ceará é o segundo Estado do Brasil em números percentuais de detentos estudando.
De acordo com a pesquisa, havia, até o fim do ano passado, 15.201 presidiários. Deste total, 15,6%, ou seja, 2.523 presos estudam. Em primeiro lugar no levantamento, está Pernambuco, pois, de um total de 23.925 presos, 16,5% estudam.
Em termos percentuais, os Estados ficam à frente de São Paulo, com 8,8%, Rio de Janeiro, com a mesma porcentagem, e Paraná, com 8,7%.
Mas, apesar do Ceará estar em uma boa classificação, muitas lacunas ainda devem ser preenchidas. No último dia 3 de outubro, iniciou o prazo de inscrições para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para presos ou jovens que cumprem medidas socioeducativas com privação de liberdade.
Porém, a inscrições, que vão até o dia 17 de outubro, não devem apresentar uma lista extensa de candidatos, já que, segundo dados da Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado do Ceará (Sejus), atualmente, no Estado, dos 16. 222 detentos, 2.405 estudam, ou seja 14,8%. Contudo, apenas 224 estão no Ensino Médio, e não há informações de quantos estão aptos a realizar o teste. Ainda de acordo com a assessoria de imprensa do órgão, apenas um detento no Ceará realizou o Enem no ano passado.
Nas 14 unidades do Estado que mantêm jovens de 12 a 18 anos cumprindo medidas socioeducativas, a realidade não é muito diferente. Dos 961 adolescentes que estudam, 200 estariam aptos por idade a fazer o teste, porém, apenas 25 têm nível educacional para prestar o exame. No entanto, não se sabe quantos irão fazer.
Na visita feita pela equipe do Diário do Nordeste ao presídio Auri Moura Costa, encontramos apenas duas detentas que vão fazer o Enem.
Sonhos
Uma delas é Meirilene Lima de Sousa, 30 anos. Há dois anos e seis meses, ela foi presa por assalto a mão armada e formação de quadrilha. Com o perfil diferente das maioria das presas que chegam nas unidades prisionais - que não sabem ler nem escrever, ou cursaram no máximo até o ensino fundamental -, Meirilene já havia concluído o Ensino Médio aos 18 anos. Mas, devido a uma gravidez precoce, ela conta que não pôde dar continuidade aos estudos.
"Aqui, tive a oportunidade de entrar novamente em uma escola. A educação é o que me conforta. Pretendo passar no Enem e, futuramente, cursar a faculdade de administração de empresas. Quero ser alguém, mudar de verdade", planeja.
OPINIÃO DO ESPECIALISTAPrática ´encharcada´ de esperança
Falar de educação numa perspectiva libertadora, tal qual foi proposta e vivida pelo educador nordestino Paulo Freire, pode parecer um contrasenso, quando os educandos em questão são pessoas jovens e adultas que estão privadas de liberdade nas cadeias, nos presídios ou nas unidades especializadas na medida sócioeducativa máxima prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, que é a internação. Porém, talvez seja nesta "situação-limite" que o ser humano mais necessite de uma relação pedagógica que promova sua condição, não apenas de cidadão, mas de ser humano pleno. A educação é prevista na Constituição Federal como direito de todos, independentemente dos erros ou crimes cometidos. Falar em direito é falar em tudo que é devido para que os seres vivam com dignidade e para que possam se desenvolver em todas as suas potencialidades. O direito exclui as noções nocivas do favor clientelista, da súplica aviltante e da esmola que humilha. Logo, a educação destinada aos privados de liberdade é a garantia de um direito a quem, na maioria dos casos, teve seus direitos sistematicamente violados. Dirão alguns, justamente indignados com a insegurança que nos cerca: como falar de direitos para quem roubou, estuprou e matou? Lembro que o preso continua sujeito de direitos, que geram deveres, pelo simples fato de serem humanos. A prática pedagógica com os privados de liberdade há de ser "encharcada" de esperança e alegria, condição para a verdadeira ressocialização, que depende de oportunidades reais.
Segundo agente pedagógica, a maioria das detentas querem estudar para dar continuidade à vida fora da prisão |
Ercília Braga de OlindaProfessora da UFC
GRANDE PROCURANúmero de vagas não corresponde à demanda
No Ceará, 96 professores ensinam em 57 unidades prisionais. Destas, oito são de grande porte. Porém, apesar de ser um direito de todos, as vagas e os horários de estudo são limitados, e muita gente fica do lado de fora da sala de aula. As unidades que oferecem mais vagas são o Instituto Presídio Professor Olavo Oliveira II, que possui 645 internos, e o Instituto Penal Feminino Desembargador Auri Moura Costa, com 517 detentas. Cada um oferta 180 vagas.
A situação se repete na Casa de Privação Provisória de Liberdade II: com 1.118 internos, há apenas 80 vagas. A Casa de Privação Provisória de Liberdade III, que possui 1.116 internos, oferta 140 vagas. O Instituto Penal Paulo Sarasate, que abriga 590 detentos, oferece 135 vagas na escola. No Instituto Psiquiátrico Governador Stênio Gomes, há 125 internos e apenas 30 vagas. Na Penitenciária Regional de Sobral, dos 526 detentos, apenas 72 podem estudar e, na Penitenciária Regional do Cariri, com 479 internos, há 120 vagas.
Segundo a coordenadora da Educação em Prisões no Estado, Magnólia Maria Costa, a disputa por um lugar nas escolas é grande, pois a maioria quer estudar. Porém, a coordenadora lamenta ainda não ter estrutura nem recursos humanos suficiente para atender a demanda. "Reconheço que a educação é de grande valia para o processo de ressocialização, pois é capaz de transformar por completo a vida dos detentos", diz.
Outra problemática que deve em breve ser revertida, segundo ela, é a educação nas cadeias. Conforme Magnólia, em muitas unidades, diante da falta de estrutura, os professores dão aula na porta das celas. Mas, de acordo com ela, a Secretaria de Justiça e Cidadania do Estado (Sejus) vai investir, até o fim do ano, na compra de 60 computadores para três unidades prisionais. Além disso, ela afirma que algumas cadeias são reformadas para oferecer espaços voltados para a educação aos presos provisórios.
Segundo Aline Costa, agente pedagógica do Presídio Feminino Auri Moura Costa, com a grande demanda de detentas e a pouca oferta, algumas regras são adotadas na unidade prisional. A primeira é priorizar as que não são alfabetizadas e as que cursam o ensino fundamental. Uma outra estratégia é ofertar vagas para as detentas que já foram julgadas.
Mesmo assim, ainda existe uma grande demanda reprimida, até porque, como a escola não funciona no período da noite, as detentas que trabalham nos dois turnos ficam sem estudar. De acordo com Aline, existem pelo menos 60 mulheres que trabalham o dia inteiro, e a maioria gostaria de estar em sala de aula. "O motivo principal é dar continuidade a vida lá fora", ressalta.
Medidas
A Sejus reconhece a demanda de detentos que necessitam de escolarização, e informou que está ampliando o seu programa de educação com o projeto de implantação de três centros Vocacionais Tecnológicos dentro das unidades penais que aumentarão o percentual de 15% para 30% dos presos em escolarização.
A Secretaria informou ainda que o percentual de presos provisórios no Ceará é bastante elevado, cerca de 60% do total, e, para incluí-los, a Sejus está programando cursos com menor duração par esse público.
O órgão afirmou que tem um projeto de ampliação de vagas do Instituto Penal Feminino Auri Moura Costa, mas descartou os cursos noturnos por medidas de segurança.
Fique por dentro
Redução de pena
No último dia 30 de junho, uma alteração na Lei de Execução Penal reduziu a pena de presos que frequentarem a escola. O novo texto diz que um dia de condenação poderá ser trocado por 12 horas de frequência escolar. Tanto condenados em regime fechado ou semiaberto poderão ser beneficiados. As atividades também poderão ser feitas a distância, desde que as unidades escolares sejam certificadas pelas autoridades. Os dias trabalhados, que já podiam ser descontados, continuam valendo como possibilidade de troca. Três dias de trabalho poderão abater o equivalente a um dia de pena. Dados do Ministério da Justiça mostram que, dos 496 mil presos dos Brasil, apenas 40 mil realizam alguma atividade educacional.
KARLA CAMILAESPECIAL PARA CIDADE
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