Machado de Assis, o original, mulato Machado de Assis, o ator, branco (FOTOS DIVULGAÇÃO) |
O plano de fundo é a cidade do Rio de Janeiro em setembro de 1908. O escolhido para o vídeo que comemora os 150 anos da Caixa Econômica Federal (CEF) foi o escritor Machado de Assis. Até ai, tudo bem encaminhado. Banco brasileiro, personagem também. Mas a identificação com os clientes não aconteceu. Machado, conhecido por ser mulato, foi interpretado por um ator branco, o que provocou polêmicas e dividiu opiniões dos brasileiros.
A campanha teve que ser retirada ainda na semana passada, na quarta-feira, 21. E, em nota, o presidente da Caixa pediu desculpas à população. “O banco pede desculpas a toda a população e, em especial, aos movimentos ligados às causas raciais, por não ter caracterizado o escritor, que era afro-brasileiro, com a sua origem racial”, disse o presidente da Caixa, Jorge Hereda, em nota. A propaganda foi alvo de reclamações na internet e de uma queixa formal divulgada na segunda-feira, 19, pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir-PR), que já havia pedido correção do vídeo.
Em sua defesa, a Caixa disse que “o banco sempre se notabilizou pela sua atuação pautada nos princípios da responsabilidade social e pelo respeito à diversidade” e lembrou de outras oportunidades em que exaltou a diversidade étnica, sexual e cultural, como na campanha “Igualdade é para valer - 2011”, para o Ano Internacional dos Afrodescentes e o patrocínio da Parada do Orgulho GLBT.
“É claro que sabíamos que ele era mulato”, diz José Carlos Borghi, sócio da agência de propaganda Borghierh/Lowe, responsável pela criação do filme polêmico. “Queríamos ser fiéis à fisionomia do escritor na fase madura da vida. Por isso, selecionamos um ator parecido com ele nesse período”, diz. Para José Carlos, o efeito da maquiagem na montagem final foi a responsável pela discussão da cor da pele.
José Carlos não esconde a preocupação com a dimensão que o incidente causou. “A Caixa é uma instituição que tem um forte papel político social, o que torna esse incidente mais desagradável”, desculpa-se. “Estamos estudando as possibilidades de refazer a peça publicitária ou até produzir outro diferente.”
Para Christiano Barbosa, da Time Comunicação, muitas vezes a publicidade tende a “pasteurizar” suas mensagens e finda por deixar de lado as diferenças étnicas, culturais e sociais, sob o pretexto de atingir um público maior com sua comunicação. A presença de afrodescendentes e mestiços se justifica não apenas em função do politicamente correto, mas também pelo fato de que os estereótipos não geram identificação com o público-alvo. “Assim, a campanha da Caixa poderia ter sido mais fiel à história. Isso elevaria o orgulho de nossas populações negras e pardas, bem como o nível de nossa propaganda”, diz.
Seppir
Para a Secretaria, a campanha que traz Machado de Assis, um dos primeiros poupadores da Caixa representado por um ator branco é uma solução publicitária de todo inadequada por contribuir para a invisibilização dos afro-brasileiros, distorcendo evidências pessoais e coletivas relevantes para a compreensão da personalidade literária de Machado de Assis, de sua obra e seu contexto histórico.
O episódio acontece exatamente no momento em que a Secretaria e a CEF estão construindo um termo de cooperação que envolve, entre outros, aspectos relacionados à representação de pessoas negras nas ações de comunicação.
O que
ENTENDA A NOTÍCIA
Em comemoração aos 150 anos da Caixa Econômica Federal, a instituição está fazendo uma série de vídeos históricos. O último, veiculado na semana passada, provocou polêmica ao trazer um ator branco para interpretar o escritor mulato Machado de Assis.
Saiba mais
A Caixa Econômica Federal tem veiculado diversas propagandas para comemorar seus 150 anos.
Cada vídeo traz passagens importantes que marcaram a história do banco. A polêmica surgiu nas redes sociais após o mais recente deles, intitulado “O Bruxo do Cosme Velho”, retratar Machado de Assis na história da Caixa por ter citado em seu testamento a conta que tinha no banco.
A campanha é composta por 12 comerciais, um por mês, que foram divididos entre as três agências que detêm a verba de comunicação da Caixa, de cerca de R$ 350 milhões. Além da Borghierh, atendem o banco também a Fischer & Friends e a Nova S/B Comunicação.
Ingrid Baquit
ingridbaquit@opovo.com.br
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