Capital perde 35% de água tratada com vazamentos na rede e fraudes

por Lêda Gonçalves - Diário do Nordeste

"Só percebemos o valor da água depois que a fonte seca", chama atenção um provérbio popular. Entretanto, em Fortaleza, 35% da água tratada é perdida por causa de vazamentos na rede e fraudes/ligações clandestinas. É o que apontam os dados da Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece), referentes a outubro deste ano. Já foi maior: no início do ano chegou a 42%. O percentual atual não difere do estudo divulgado, em 2015, pelo Instituto Trata Brasil. Ele indica desvios de 34,92% na Capital cearense, mas que, mesmo com todo investimento da Companhia no combate ao desperdício e espoliação, ainda é preciso mais participação da população para reduzir os danos e assegurar maior segurança hídrica.

A empresa investiu, no último ano, R$ 14 milhões em ações, informa a diretora de Mercado da Companhia, Cláudia Caixeta. Desse total, cerca de R$ 5 milhões foram aplicados em ações de combate às fraudes, totalizando 21 mil imóveis visitados até o momento. Destes, cerca de 14 mil foram regularizados junto à Cagece. Um total de 252 litros por segundo já foram recuperados por meio desse trabalho. Já no combate aos vazamentos, a Companhia aplicou cerca R$ 9 milhões e já recuperou 230 litros por segundos. Além disso, a Cagece diminuiu para 11 horas o tempo médio para retirada de vazamentos nas redes de abastecimento em Fortaleza e Região Metropolitana.

"Outra coisa importante de esclarecer é que perda não significa ineficiência. É resultado de vários fatores, como ligações clandestinas, áreas de ocupações irregulares, sub-medição. A gente trabalha com as variáveis que podem ser revertidas e recuperadas. Um vazamento, por exemplo, leva tempo para aparecer", explica.

Aprendizagem

"Aprendemos muito com a seca no meio rural, mas é preciso que as cidades como Fortaleza também aprendam", afirma o titular da Secretaria de Recursos Hídricos (SRH), Francisco Teixeira. A população urbana, aponta, principalmente da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) tem que entender que a água vem de longe e que são investidos milhões e milhões de reais para garantir esse recurso. "Com o São Francisco, por exemplo, a Capital terá abastecimento vindo de quase 800 quilômetros. Por isso, economizar deve ser ação permanente", salienta.

Investimentos

Segundo ele, o governo, com receita do tesouro estadual e da União, já disponibilizou, R$ 1 bilhão, somente no âmbito da SRH. "Se somarmos tudo que foi investido na Secretaria das Cidades, Cagece, Secretaria de Desenvolvimento Agrário (SDA), temos aí mais de R$ 1,5 bilhão", explicou.

A água é um bem imensurável. De acordo com Teixeira, o Estado investe e estrutura-se com um plano de ações estratégicas, o Ceará 2050, para melhor conviver com as secas futuras. "Teremos um incremento de um conjunto de adutoras, mais do que fazer barragem, para ganhar eficiência na condução da água. Mas, sem a parceria da população na economia do uso das fontes, fica complicado".

Na visão do professor e engenheiro hidráulico, José Nilson Campos, em termos globais, a oferta de água corre o risco de entrar numa crise profunda, pressionada cada vez mais pelo crescimento demográfico, pelas mudanças climáticas, pela contaminação de fontes e pelo desperdício. A falta de água, aponta, afeta não só a saúde humana, mas também o desenvolvimento socioeconômico da sociedade e o rumo das relações entre nações. "Então, além de buscarmos um sistema de gerenciamento dos recursos hídricos sustentável, precisamos investir em cidades sustentáveis. O que ainda estamos muito longe de conseguir", avalia.

Francisco Teixeira concorda e defende a diversificação das fontes hídricas. Para ele, mesmo numa cidade como Fortaleza, de frente para o mar, a água dessalinizada é muito cara, assim como a de reúso. No futuro, preconiza, na RMF, água de reúso para uso industrial, água dessalinizada para abastecimento humano, e dos açudes, como sempre, do Óros, Castanhão, Banabuiú, e do próprio São Francisco, vai ser como a energia, uma lâmpada pode estar acesa, mas você não sabe de onde vem a energia, porque ela se origina de diversas fontes. "Do mesmo será a água no futuro, virá de várias matrizes, inclusive captada da chuva, de poços. Ninguém pode ter preconceito com a água, porque as fontes hídricas não são excludentes e sim complementares", diz.

Segundo Cláudia Caixeta, o esforço para manter o abastecimento de água de Fortaleza e Região Metropolitana foi destaque durante encontro das companhias de água e esgoto de todos os estados brasileiros, na sede da Agencia Nacional de Águas (ANA), em Brasília. "São seis anos de seca e, mesmo assim, atingimos esse feito sem racionamento e isso não se faz sem um gerenciamento correto. O que fazemos no Ceará impressiona a todos, principalmente aqueles com sérios problemas hídricos, como São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, entre outros. Por isso, mais do que tudo, cada gota conta", comenta.

Fique por dentro

Economizar para não faltar deve ser ação conjunta

A água é um recurso natural fundamental para a sobrevivência. O planeta Terra é coberto por aproximadamente 1,4 bilhão de km³ de água, sendo 97,5% de água salgada e 2,5% de água doce. Dessa pequena parte, quase 70% estão em geleiras e calotas polares.

No Brasil, conforme dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), de toda água coletada e tratada em 2015, cerca de 37,5% foi perdida, seja com ligações clandestinas, vazamentos, roubos, falta de medição ou medições incorretas no consumo.

A Tarifa de Contingência é um dispositivo de gestão assegurado pela Lei de Saneamento (N° 11.445/07). Em Fortaleza e Região Metropolitana (RMF), o mecanismo tarifário estipula uma meta de redução de 20%, com base no histórico de consumo de cada cliente da Cagece.

Aqueles que não atingem a meta, são tarifados em 120% pelos metros cúbicos que deveriam ter sido economizados.

No primeiro semestre de 2017, aproximadamente 234 mil clientes pagaram a tarifa de contingência. No total, foram arrecadados cerca de R$ 43 milhões por meio dela.