por Honório Barbosa - Diário do Nordeste
Açude Castanhão, maior do Ceará e responsável pelo abastecimento de cidades do Baixo Jaguaribe e da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), registra o menor volume desde 2003, quando foi inaugurado. O reservatório acumula apenas 4,4% da sua capacidade, o equivalente a 294 milhões de metros cúbicos. É o reflexo da maior e mais prolongada crise hídrica enfrentada pelo Estado.
Além do Castanhão, o Orós, o segundo maior reservatório, que atende atualmente a demanda do Médio Jaguaribe, assiste diariamente a sua vazão ser reduzida. O volume atual é de 8,7%. O Banabuiú, o terceiro maior do Estado, permanece seco. As reservas hídricas nos 154 açudes monitorados pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh) totalizam em média 10,6% da capacidade.
O segundo semestre é caracterizado por escassez de chuvas no Ceará. É um período crítico, que agrava a situação de queda das reservas hídricas nos reservatórios do Estado. O reduzido volume de água no Castanhão compromete atividades produtivas (agricultura, pecuária e criação de peixe em cativeiro) e o abastecimento de milhões de famílias.
O baixo nível dos reservatórios é consequência de seis anos seguidos de chuvas abaixo da média no Estado. Não está descartada a possibilidade de racionamento de água para as cidades da RMF e do Baixo Jaguaribe, conforme reconheceu, recentemente, o secretário Dedé Teixeira, titular da secretaria de Desenvolvimento Agrário (SDA).
A travessia dos chamados "B-R-O Bros" (setembro a dezembro) vai trazer fortes impactos mediante o sol intenso, cobertura de nuvens reduzida, aumento da temperatura e da evaporação. "A situação é grave e preocupante", adverte o meteorologista da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), Raul Fritz. "No segundo semestre ocorrem apenas chuvas localizadas, de baixa pluviometria, em poucos municípios. É quase que nulo".
Volume morto
Para o Departamento Nacional de Obras contra a Seca (Dnocs) que administra o Castanhão e outros reservatórios federais, o açude deve alcançar o volume morto em fins de outubro ou início de novembro, quando atingir a cota de 250 milhões de metros cúbicos. Tecnicamente, o volume morto é a reserva de água mais profunda, abaixo da cota de captação, ou seja, a liberação de água deixa de ser por gravidade e exige bombeamento. "Nesse caso, teremos uma água mais cara e com qualidade mais comprometida", observa o coordenador do Complexo Castanhão, Fernando Pimentel. "Enfrentamos um quadro muito difícil com perda elevada por evaporação e transferência de um milhão de metros cúbicos por dia".
Já para a Cogerh, o Castanhão atinge o volume morto quando alcançar a cota de 60 milhões de metros cúbicos. Atualmente, ele libera 4,3 m³/s para o leito do Rio Jaguaribe e 3,0m³/s para o Eixão das Águas, que atende a RMF. A Cogerh estima que, em 31 de dezembro de 2017, o Castanhão deverá acumular cerca de 169 milhões de metros cúbicos.
No fim do ano, o Orós deverá ter um volume reduzido para 6,2%, equivalente a 120 milhões de metros cúbicos. Atualmente, o açude libera 3m³/s para atender demanda de Feiticeiro, Lima Campos, Jaguaretama e outras localidades no Vale do Jaguaribe. A preocupação é que o governador autorizou a instalação, em caráter de urgência, de uma adutora do Orós para Icó com vazão de mais 400l/s. O integrante do Comitê da Bacia Hidrográfica do Alto Jaguaribe, Paulo Landim, mostra preocupação. "No ritmo que vai, o Orós deve chegar em fins de janeiro em torno de 4%".
Crise
Neste período do ano, o sol está ardendo no sertão cearense e, nos próximos meses, a temperatura tende a subir cada vez mais. No Estado, a estação chuvosa ocorre entre fevereiro e maio. "Isso não significa que não chova em outros meses, mas é uma quantidade insignificante para repor as reservas hídricas", observa Fritz. A média pluviométrica de junho, o primeiro mês após a quadra chuvosa, é de 37.5mm e a de julho é somente de 15.4mm. Em agosto é de 4.9mm; em setembro, 2.2mm; em outubro sobe para 3.9mm; em novembro, é de 5.8mm e em dezembro chega a 31.6mm. Neste ano, junho apresentou em média um déficit de chuva de 32.1%. Em julho ocorreu um índice positivo de 99.3%, mas em agosto voltou a cair, e registrou um desvio negativo de 59,2%.
Os dados da Funceme revelam que o trimestre junho, julho e agosto foi melhor neste ano, em comparação com 2016. Em julho do ano passado, houve em média um déficit de 93.2%, mas, no mesmo período de 2017, ocorreu um índice positivo de 99.3%. Em agosto choveu menos, tanto em 2016 (-98.8%), quanto em 2017 (-52.3%).
O meteorologista da Funceme, Raul Fritz observa que as reduzidas chuvas ao longo do segundo semestre é uma característica climática da região do Semiárido. "Em dezembro, geralmente ocorrem influências de sistemas frontais da Bahia que chegam atingir o Sul do Ceará, o Cariri, que apresenta a média mais elevada do Estado (66mm) para o período", pontuou.
"Chove tão pouco no segundo semestre que às vezes uma chuva localizada já ultrapassa significativamente a média", mostra Raul Fritz. Foi o que ocorreu em Sobral, Quixeramobim e Pentecoste, que registraram as últimas chuvas em agosto passado, no dia 27, variando entre 2.2mm a 4.7mm.
Os mapas de chuva da Funceme revelam que, ao longo do mês de agosto passado, houve registro de chuva em 20 municípios, mas a maioria precipitações muito reduzidas, abaixo de 5mm. A exceção foram chuvas de 29.6mm em Redenção e de 24mm em Quixeramobim, no dia 26. Nos outros dias em que choveu houve registro praticamente em apenas uma localidade no Estado.
Previsões
Mediante o grave risco de esgotamento das reservas hídricas estratégicas no Estado (nos açudes Castanhão, Orós e também em outros reservatórios de médio porte até fevereiro de 2018), a situação de perda de água nos reservatórios tende a piorar. Muitos municípios podem entrar em colapso. "Começamos o período mais crítico dessa série histórica de seis anos de chuvas abaixo da média", observou o secretário de Recursos Hídricos, Francisco Teixeira. "Caso não ocorram fortes chuvas na próxima quadra invernosa, sem recargas dos açudes, vamos depender da transposição do Rio São Francisco", completou.
Se não houver recarga na próxima quadra chuvosa, 2018 será o limite para que a maioria dos açudes do Ceará entre em volume morto, atinja a quota mínima e fiquem secos, ainda no primeiro semestre. "Por enquanto, é difícil fazer qualquer previsão para a quadra chuvosa do próximo ano", diz Raul Fritz. "A tendência é de um Oceano Pacífico com temperaturas superficiais neutras e vamos depender novamente do Oceano Atlântico, que tem uma bacia menor e muita variabilidade térmica em curto período de tempo".
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