Juntos, os últimos cinco anos formaram o período mais seco do Ceará em mais de um século de história. Um estudo realizado pela Fundação Cearense de Meteorologia (Funceme) e divulgado ontem revelou que, de 2012 a 2016, a média de chuvas registrada no Estado chegou a baixos 516mm. Individualmente, nenhum dos anos teve volume de precipitações acima de 600mm, quando a média histórica anual fica em torno de 800mm. Com base nos dados compilados, o órgão classificou o período atual de estiagem como a pior seca prolongada (cinco anos consecutivos) desde 1910.
Nesse intervalo de tempo, somente dois outros períodos (1951 a 1955 e 1973 a 1986) tiveram tão poucas chuvas. Ainda assim, as precipitações foram mais densas que as observadas de 2012 para cá. Na década de 1950, a média dos cinco anos totalizou 608mm, com um ano, 1955, ultrapassando a média histórica. Já na seca dos anos 1970, a média total alcançou 566mm, 10% a mais que a do ciclo atual.
David Ferran, meteorologista da Funceme responsável pelo estudo, explica que uma possível razão para a estiagem tão forte e persistente pela qual o Estado passa é o agravamento das mudanças climáticas. "É difícil ser taxativo, mas uma característica das mudanças climáticas é a ocorrência de eventos extremos e essa sequência de anos secos é bastante extremo. Isso nunca havia acontecido dessa forma nos últimos 100 anos", destaca.
Açudes
Conforme ressalta Ferran, o impacto de anos seguidos de chuvas abaixo da média recai, principalmente, sobre os reservatórios do Estado. Em 2012, primeiro ano do atual ciclo de estiagem, o Diário do Nordeste produziu uma série de reportagens especiais mostrando o panorama do sertão cearense diante do baixo volume de precipitações. A reportagem acompanhou a situação dos açudes no início e no fim do ano. No mês de janeiro, os reservatórios estavam com 71% da capacidade. Em dezembro, esse percentual havia caído 20 pontos, passando para 51%.
Ontem, segundo dados da Funceme e da Companhia de Gestão de Recursos Hídricos (Cogerh), os açudes cearenses se encontravam com apenas 9% de sua capacidade. Ao todo, 129 açudes estão com volume inferior a 30%. "Mesmo reservatórios grandes não têm capacidade de resistir por muito mais tempo. Quando chove pouco em um ano, mas depois chove muito, os pequenos açudes se recuperam. Mas, nessa sequência de cinco anos, praticamente não teve água entrando nos reservatórios", afirma Ferran.
O meteorologista lembra que, para este segundo semestre, a previsão é de poucas precipitações, insuficientes para a recarga dos açudes. Em relação à quadra chuvosa do ano que vem, ele ressalta que, embora ainda seja cedo para definições, os sinais apontam para um cenário "neutro" no Oceano Pacífico, sem a ocorrência dos fenômenos El Niño ou La Niña.
"Nesses anos, temos que aguardar até janeiro para ter uma previsão. A chance de acontecer um ano seco é a mesma de acontecer ano chuvoso. Se olharmos no passado, no período chuvoso de 1952 a 2015, tivemos 38 anos neutros no Pacífico. Destes, 12 foram secos, 13 normais e 13 chuvosos. É bem dividido", observa o meteorologista.
Ações
Além do baixo volume de precipitações, o titular da Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará (SRH), Francisco Teixeira, destaca que a situação do abastecimento foi agravada pelo aumento do consumo de água nas últimas décadas, provocado pelo crescimento da população, assim como a maior urbanização e industrialização no Estado.
Segundo ele, o Governo do Estado tem investido em ações como construção de poços e adutoras, instalação de chafarizes e utilização de dessalinizadores para, no mínimo, garantir o suprimento de água até a estação chuvosa do ano que vem. "Como os reservatórios estão secos, a água de poços é o que temos para chegar até a próxima estação. Aí poderemos ter o restabelecimento dos açudes. Nem precisa encher todos, se tiver recarga de 20% já ajuda", afirma.
Teixeira destaca que a SRH ainda aposta nas medida previstas no Plano de Segurança Hídrica da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), anunciado em julho deste ano. A iniciativa envolve o combate a perdas de água, a revisão da meta da tarifa de contingência, o reúso de águas de lavagem da Estação de Tratamento de Água do Gavião, a perfuração de poços na região do Pecém, dentre outros pontos. Segundo ele, a expectativa é que o conjunto de ações ajude o Estado a obter uma "economia substancial de água".
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