Apontado pelo setor produtivo como um avanço que trará mais segurança jurídica e dinamicidade e visto por entidades de classe como um retrocesso nas leis trabalhistas, o projeto de lei 4330/04, que regulamenta as terceirizações, permanece como uma das propostas mais polêmicas no Congresso e é alvo de um único consenso: caso entre em vigor, trará mudanças que afetarão de forma significativa a economia do País.
Além dos receios ligados à possibilidade de perda de benefícios e enfraquecimento de diversas categorias, opositores da medida destacam a queda na qualidade de serviços - sobretudo no poder público - como um dos principais prejuízos que o projeto pode trazer.
"O povo brasileiro como um todo vai ser o principal atingido, porque vai contar com um serviço com qualidade pior. No lugar de técnicos que entraram por mérito (concurso público), vamos ser atendidos por pessoas que estão ali porque trabalham pra uma empresa que gastou milhões para apoiar um candidato", afirma o diretor da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no Ceará, Roberto Luque.
Influência política
Para Luque, o fato de o projeto possibilitar a terceirização para atividades-fim em empresas públicas ou de economia mista fará com que a maior parte dos funcionários por elas contratados cheguem aos cargos por influência política.
"E você tem que pensar também nos jovens que estão agora saindo da faculdade ou há anos se preparam para um concurso e agora vão ser prejudicados", acrescenta. Conforme Luque, entre as principais categorias que deverão ser impactadas pelo projeto estão bancários, profissionais que trabalham com tecnologia da informação e petroleiros.
"Prestação de contas"
Os interesses políticos se sobrepondo à economia também são uma preocupação para o juiz do trabalho Eliude Oliveira, do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 7ª região. "O que a gente viu ontem (na última quarta-feira, durante a aprovação do projeto na Câmara) foi uma prestação de contas. Muitos dos políticos que votaram a favor foram financiados por grandes prestadoras de serviços e agora estão pagando de volta", afirma.
Outro receio, indica, é a possibilidade de os trabalhadores serem prejudicados por terceirizadas que, ao passar por dificuldades financeiras, não tenham patrimônio suficiente para quitar dívidas com os trabalhadores "Hoje, já temos milhares de processos desse tipo na Justiça do Trabalho", indica.
Construção civil
Conforme o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Ceará (Sinduscon-CE), André Montenegro, a aprovação do projeto não trará prejuízos aos trabalhadores do setor. "O terceirizado vai ter os mesmos direitos, vai ter que ganhar as mesmas coisas", frisa. De acordo com Montenegro, a principal vantagem da medida, para o trabalhador, será o fim da rotatividade entre empresas, já que não será preciso mudar de empresa sempre que sua função em determinada obra não for mais necessária.
Para as empresas do setor, afirma, o ganho principal será de produtividade, uma vez que os profissionais contratados, em vez de desempenhar diversas funções, serão especialistas em suas respectivas áreas, o que resultará em mais agilidade e qualidade nos serviços.
Comércio
De acordo com o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Fortaleza, Severino Neto, a principal vantagem para o comércio da Capital, a partir do projeto, seria trazer mais transparência e segurança a trabalhadores que, por atuarem no comércio e na indústria, ficavam em uma "posição de dúvida" perante o Ministério do Trabalho.
"O que precisamos é qualificar nossa equipe. Não vamos terceirizar qualquer atividade. O que queremos é suprir algumas áreas onde deve haver mais segurança", ressalta, acrescentando que não há a previsão de o setor cancelar postos de trabalho hoje existentes para substituí-los por vagas para profissionais terceirizados. As possíveis terceirizações, frisa, se darão através da criação de novos empregos, e não de demissões entre os funcionários atuais.
Opinião do especialista
Medida representa retrocesso
A terceirização das atividades-fim traz enormes prejuízos aos trabalhadores. Em geral, os terceirizados possuem salários bem menores, tanto que houve a preocupação do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, com a arrecadação, como no caso do Imposto de Renda retido na fonte. Agora, em relação à classe trabalhadora, não houve essa preocupação. Também é de se lamentar que isso esteja acontecendo também por uma briga entre o Planalto e o Congresso, colocando em xeque vários direitos dos trabalhadores. Nesse contexto, atividades ligadas ao setor elétrico, água, petróleo, educação e aos bancos estão entre os que mais serão prejudicados. Por exemplo, os bancos vão poder contratar pessoas para desempenhar o mesmo trabalho dos bancários, mas trabalhando mais e ganhando menos.
A única vantagem apresentada até agora com esse projeto são os custos menores para os empregadores. Mas não se deve transmitir esse ônus para os trabalhadores. Isso seria um retrocesso para a década de 1930. O que se deveria fazer era buscar melhorar a rentabilidade através de novos equipamentos, formas de gerência e qualificação, por exemplo.
Reginaldo Aguiar
Economista do Dieese
João Moura
Repórter
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