segunda-feira, 30 de março de 2015

Professores de escolas estaduais e municipais já recebem mais que os de particulares.


A professora Lucy Bauly trocou uma escola particular por uma pública
Foto: Fabio Rossi / Agência O Globo
A professora Lucy Bauly trocou uma escola particular por uma pública - Fabio Rossi / Agência O Globo

RIO - A professora Lucy Corrêa Bauly, de 58 anos, trabalhou em escolas particulares por 23 anos. Foi um período em que, na média, os profissionais que davam aulas na rede privada recebiam salários maiores do que no setor público. Segundo ela, para os padrões da profissão, o pagamento que recebia por hora aula era até bom. No entanto, uma reestruturação no colégio onde trabalhava alterou esse quadro. Foi aí que decidiu, em 2012, fazer concurso para o município.

— Já entrei com um salário maior do que ganhava na rede particular. Era algo em torno de R$ 2.600. Logo depois, o sindicato brigou para que existisse uma equiparação dos nossos salários com uma outra categoria que exercia as mesmas funções e, aí, nosso salário aumentou para quase R$ 5 mil. É óbvio que o professor merece mais, mas, para mim, foi um aumento salarial relevante.


Dados tabulados pelo GLOBO na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, do IBGE, mostram que a rede pública já paga, em média, salários melhores aos seus professores na educação básica em comparação à particular. Até o final da década passada, o padrão era o contrário. Em 2002, considerando todos os professores com diploma de nível superior dos ensinos fundamental e médio, um docente da rede privada recebia, em média, 18% a mais em seu trabalho principal para uma jornada de 40 horas semanais. Ao longo da década passada, a distância entre as duas redes em termos salariais foi diminuindo, até que, em 2011, pela primeira vez, a rede pública superou a particular. Os últimos números da Pnad, de 2013, mostram que o rendimento médio de um professor da educação básica na rede pública é 6% maior do que na rede privada.

LEI DO PISO CONTRIBUIU

A reversão desse padrão aconteceu principalmente por causa da melhoria salarial verificada no setor público no ensino médio e no segundo segmento do ensino fundamental, o antigo ginásio. Nesses dois segmentos, enquanto os profissionais da rede pública registraram aumentos reais (superiores à inflação do período) entre 2002 e 2013, os que davam aulas no ensino particular viram seus salários caírem, quando considerada a inflação. No primeiro segmento do ensino fundamental (antigo primário), os salários da rede pública já superavam os da particular em 2002, e houve aumento real no período nos dois setores.

Para o presidente do Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação), Eduardo Deschamps, um dos fatores que contribuiu para os rendimentos do setor público terem superado os da rede privada foi a Lei do Piso Nacional do Magistério, aprovada em 2008. Deschamps, que é também secretário em Santa Catarina, defende ajustes na lei para, segundo ele, garantir que ela seja sustentável — os secretários pedem mais recursos da União ou mudanças na forma de cálculo do reajuste —, mas reconhece que a legislação tem proporcionado aumentos superiores à inflação no setor público.

— Enquanto os salários da rede privada são reajustados normalmente pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), o piso variou entre 2011 e 2014 algo em torno de 78%, para uma inflação que não chega à metade deste percentual.

A secretária municipal de educação do Rio, Helena Bomeny, conta que a melhoria dos salários tem feito também a relação de candidatos por vaga aumentar em concursos para o magistério. O salário base hoje no município para 40 horas semanais é de R$ 4.410, chegando a R$ 4.947 quando somados benefícios como auxílio transporte, alimentação e bônus cultura, que elevam o valor do salário inicial para R$ 4.947.

— No nosso último concurso, foram 54 candidatos por vaga —, diz a secretária.

REDE PRIVADA TEM MAIS DISPARIDADES

Na comparação entre rendimentos dos setores público e privado, é preciso considerar que os salários tendem a ser mais homogêneos no setor estatal. No município do Rio, por exemplo, há colégios de elite no ensino médio que pagam R$ 60 por hora de aula, enquanto outros pagam somente o piso, de R$ 15. Ou seja, o salário mensal de um professor da rede privada que consegue fazer 40 horas semanais nesses valores de hora aula pode variar de R$ 9.600 a R$ 2.400.

Algumas pesquisas publicadas nos últimos anos já vinham registrando a diminuição desse diferencial entre as redes. Um estudo apresentado em 2007 pelos pesquisadores Samuel Pessoa, Fernando Barbosa Filho e Luis Eduardo Afonso, da FGV e da USP, indicava que a vantagem salarial dos professores da rede privada variava apenas de 5% a 11%, a depender do nível de ensino. Os autores argumentavam na época, no entanto, que a carreira no setor público já era mais vantajosa do que no privado, se fossem consideradas as regras de aposentadoria, mais favoráveis para servidores públicos do que na iniciativa privada.

Lucy Bauly, a professora que trocou a rede privada pela pública há três anos, diz que a estabilidade é outro fator a favor do setor estatal.

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— No colégio particular você pode ser o melhor professor do mundo, mas é o aluno que dá o dinheiro. E a direção, na dúvida, geralmente aceita mais a versão do aluno do que a do professor em momentos de crise.

Ela afirma que a maior diferença que ela percebeu logo que trocou de rede foi na infraestrutura.

— A primeira escola municipal em que atuei não tinha ar-condicionado, eu levava ventilador de casa e o material para sala de aula era escasso. A que eu estou agora possui uma direção muito atuante que muda esse cenário. Mas deveria ser assim em toda escola: com bons salários e uma infraestrutura adequada.



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