Conheça Nello Baia, um homem que renasceu das cinzas

Nello Baia é professor de yoga (FOTO: Arquivo pessoal)

Entradas nos cabelos, óculos de haste grossa e o violão em mãos. A voz calma e suave confunde ao contar sua densa história. Já conhecia parte da vida do escritor e professor de yoga Nello Baia, mas escutar de sua boca tudo o que passou e enfrentou é mais emocionante. Aos 22 anos, foi preso acusado de terrorismo contra a própria pátria, no período bem conturbado do país: o regime militar. Hoje, Nello traz as lembranças marcadas no corpo.

Nascido em São Paulo, Nello passou maus bocados até chegar em Fortaleza, no ano de 2006. Foi de fuzileiro naval a preso político. De dependente químico a monge budista. De um homem sem perspectiva de vida a alguém que sonha e muito.

Aos 60 anos, Nello acredita que seu maior aprendizado foi o de perdoar. Escreveu o livro “O homem que renasceu das cinzas” contando a trajetória.

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Prisão e tortura

Nello Baia ainda criança, com fantasia de índio (FOTO: Arquivo pessoal)

Aos 14 anos, foi conquistado pelo sentimento das manifestações. Frequentava todas das quais tinha notícias na capital paulista. Uma vez, acertou um cavalo de militar com a bolinha de gude. Foi sua grande vitória. Era fã de José Dirceu e José Genuíno. Nem imaginava que iriam ser condenados por corrupção. Lia todos os livros proibidos de autores esquerdistas, como Karl Marx.

Cresceu e ingressou com concurso público às Forças Armadas da Marinha. Cansado de todo o ensinamento militar e de ver seus ídolos serem considerados criminosos, resolveu fugir. Cometeu um grande erro. Deixou todos os livros proibidos dentro do armário, que logo após foi arrombado. Passou de militar a terrorista perseguido pela própria Marinha.

Tortura, choque, porrada, humilhação. A pressão psicológica foi enorme. Nello foi mudado de presídio. Foi parar no Rio de Janeiro. A mãe insistia em visitá-lo e chorava toda vez o que via. Ele acabou se apaixonando e se desapaixonando, mesmo sendo um presidiário. Sobreviveu a esses tormentos que duraram longos oito anos e meio.

Drogas e renascimento

Com muitas mágoas e feridas, quis apagar o passado usando drogas. Ao 30 anos, tornou-se dependente químico. Por mais 17 anos, viveria na ilusão de que tudo seria deletado da sua memória com a ajuda do vício. Grande engano.

Nello no momento das aulas de yoga (FOTO: Arquivo pessoal)

Em busca de paz espiritual, Nello encontrou o budismo, aos 47 anos. Procurou a Escola Terra Pura da China, em São Paulo, e tornou-se o primeiro brasileiro monge da escola, em 2002. Abriu as portas para outros interessados e percorreu o Nordeste, ensinando a arte da meditação.

Foi quando conheceu Ana Cláudia Dutra em Fortaleza, com quem casou em 2006. Encontrou a paz e o amor. Hoje, se dedica a ajudar outras pessoas a encontrarem essas e outras alegrias na vida através da reflexão com yoga e meditação.

Após tanto sofrimento e várias renúncias, Nello considera-se um homem forte. Conclui que passou por isso para entender seu futuro. Também leva consigo o aprendizado de que é necessário viver o momento presente, para transformar o futuro. As feridas do passado ficaram por lá. A espera pelo futuro vem cheia de objetivos e de desejos. E como disse Buda, “é capaz quem pensa que é capaz”… Que assim seja.