Uma surpresa das grandes aguarda o leitor mais incrédulo. Existe uma nova geração de brasileiros, com idade entre 18 e 24 anos, que pensa de uma maneira totalmente diferente das gerações que a antecederam. No entanto, não faz disso motivo para guerra, muito pelo contrário. Sim, porque esses moços -que de pobres moços não têm nada - celebram a polifonia, valorizam o diálogo, primam pela coletividade e acreditam que exista uma interdependência entre o bem-estar individual e o da sociedade.
Este é o perfil que revela a pesquisa Sonho Brasileiro, realizada pela empresa de mapeamento de tendências Box1824, com o objetivo de investigar o que a atual geração de 18 a 24 anos (faixa etária mais influente na criação e disseminação de novas ideias, segundo a agência) está sonhando para o País.
E os resultados são, sim, surpreendentes. A começar pela relação destes jovens com a família, ou melhor, com o conceito que eles têm de família. Cinquenta e três por cento dos entrevistados acreditam ter mais semelhanças do que diferenças em relação a seus pais. A causa dessa sensação segundo a pesquisa, é a horizontalização das relações familiares, que hoje costumam ser pautadas pelo diálogo, admiração e apoio mútuo entre pais e filhos (em contraponto ao modelo patriarcal verticalizado que era referência até pouco tempo atrás no Brasil).
Setenta e nove por cento destes jovens afirmaram acreditar que família não é apenas laço de sangue e 74% disseram que se sentem livres para constituir uma família dependendo só da própria vontade, ou seja, veem com uma escolha pessoal, não mais como obrigação.
Mesmo com tanta proximidade assim com os pais, essa nova geração difere muito deles. Para esses rapazes e moças, o trabalho não representa apenas acúmulo de dinheiro ou símbolo de status social. A pesquisa mostra que mesmo relacionando dinheiro a estabilidade, os jovens hoje veem no trabalho a oportunidade de se realizar pessoalmente. “O trabalho é cada vez menos visto como necessidade, e cada vez mais como elemento de realização e expressão. Os exemplos profissionais mais admirados são aqueles que conseguem aliar as duas coisas. Uma não menos importante que a outra. Ambas integradas. Essa é uma nova noção de sucesso que ganha força”, aponta o relatório final do estudo.
A coletividade volta à pauta desta geração, depois do individualismo predominante nas décadas de 80 e 90 do século passado (lembra dos yuppies?), mas ela é totalmente reformatada. Sua principal característica é a ideia da interdependência entre o bem-estar individual e o da sociedade, ou seja, é a vez do conceito de que pensar no outro não exclui pensar em si mesmo.
Setenta e quatro por cento dos jovens afirmaram que se sentem na obrigação de fazer algo coletivo no seu dia a dia, e 79% deles disseram que concordariam em utilizar parte de seu tempo livre para ajudar a sociedade. Mesmo que estar sintonizado com um discurso de coletividade não implique a prática deste discurso, o relatório ressalta que esses depoimentos apontam “que (a coletividade) é um valor que passa a ser cada vez mais socialmente aceito e que a sociedade espera que as pessoas adotem essa postura”.
Ponte
Mas talvez a grande descoberta feita em Sonho Brasileiro seja a do que os pesquisadores chamam de “Jovem-Ponte”, que seria o grande catalisador de ideias e influenciador desta geração. De acordo com o estudo, normalmente as pessoas se relacionam de forma mais intensa com três ou quatro grupos sociais (família, trabalho, estudo e mais um outro).
Este jovem-ponte transita por muitos mais grupos que este padrão. “Além de transitar por mais grupos, sua visão sobre o coletivo e suas ações se amplifica e diversifica; ele recolhe ideias e pensamentos destes grupos para evoluir seu próprio pensamento e suas ações; seu principal papel é redistribuir estes pensamentos e ideias, conectando redes e pessoas que nunca se falariam espontaneamente”.
De acordo com a pesquisa, 1 em cada 12 jovens brasileiros se enquadra neste perfil, o que leva a um total de 2 milhões de pessoas. Esta expressiva quantidade talvez explique algumas das características apresentadas pelo levantamento
Como a de que essa geração, tenha trocado o “ou” pelo “e” (é muito menos radical e mais agregadora; integra construindo, sem rupturas), abre o diálogo sobre preconceitos e diferenças, abrem a possibilidade de fazer política cotidianamente (e não partidária nem institucionalizada), constrói um novo tipo de participação coletiva; acredita que a presença independe do espaço físico e acreditam que a transformação se dá através das pessoas. Sinais que tempos melhores virão.
Números
55%
sonham com formação profissional e emprego, o segundo item na lista é casa própria (15%), seguido por dinheiro (9%) e família (6%)
77%
têm intenção de cursar o ensino superior. Esta vontade é compartilhada por todas as classes sociais (79% nas classes A e B, 77% na classe C e 74% nas classes D e E).
31%
afirmaram que seu sonho para o Brasil é que tenha respeito e cidadania; 18% querem que o País tenha menos violência e 13% menos corrupção.
Émerson Maranhão
emerson@opovo.com.br
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