Zico revela, em entrevista à PLACAR, alguns segredos dos bastidores do clube de maior torcida do Brasil
Patrícia Amorim anunciou Zico como diretor executivo de futebol do Flamengo no dia 30 de maio. O time não ia bem na temporada, após desempenho abaixo do esperado no Carioca e na Libertadores, além de campanha fraca defendendo o título no Brasileirão.
Exatamente quatro meses após sua chegada, o Galinho anunciou, na madrugada de sexta-feira, 1º de outubro,(2010) sua saída do Rubro-Negro. Na Revista PLACAR de outubro, o ídolo da Gávea revelou as dificuldades com as artimanhas da política interna, das críticas vindas de todos os lados e das limitações do orçamento. Leia, abaixo, trechos da entrevista.
Na sua filosofia de trabalho, caberia um Adriano — craque com problemas extracampo?
Qual a vantagem que o Adriano trouxe ao Flamengo? O título brasileiro? Isso não paga. Brasileiros, só o Flamengo já tinha cinco. Ter que pagar um preço muito grande como se pagou para ter um título brasileiro, é algo que nem o próprio Adriano gostaria que fosse assim. Ele é um garoto de boa índole, não faz mal a ninguém. É justamente isso que nos entristece. É ele às vezes se deixar levar por certa euforia do sucesso e acabar dando o exemplo negativo. O Adriano não é esse tipo de pessoa, não gosta de se exibir, deve ter algum tipo de problema que o leva a cometer esses exageros. Em volta dele é muita coisa. Teve esses problemas todos, e acho que, se fosse um cara egoísta, as pessoas não dariam tanto espaço e oportunidades como deram a ele. Todo mundo queria ajudar. Ele tem um problema e deveria ficar longe desse problema, mas a vinda para o Rio o deixou ainda mais perto…
Qual a vantagem que o Adriano trouxe ao Flamengo? O título brasileiro? Isso não paga. Brasileiros, só o Flamengo já tinha cinco. Ter que pagar um preço muito grande como se pagou para ter um título brasileiro, é algo que nem o próprio Adriano gostaria que fosse assim. Ele é um garoto de boa índole, não faz mal a ninguém. É justamente isso que nos entristece. É ele às vezes se deixar levar por certa euforia do sucesso e acabar dando o exemplo negativo. O Adriano não é esse tipo de pessoa, não gosta de se exibir, deve ter algum tipo de problema que o leva a cometer esses exageros. Em volta dele é muita coisa. Teve esses problemas todos, e acho que, se fosse um cara egoísta, as pessoas não dariam tanto espaço e oportunidades como deram a ele. Todo mundo queria ajudar. Ele tem um problema e deveria ficar longe desse problema, mas a vinda para o Rio o deixou ainda mais perto…
Por que aceitar o Flamengo agora? O fato de ser a Patrícia no comando pesou?
Não, foi o momento mesmo, achei que poderia dar alguma colaboração. As últimas experiências lá fora também não foram tão agradáveis. E, com a chegada do neto, quis ficar mais por aqui. Perdi muito tempo de ver meus filhos crescerem, agora quero ver os netos, são dois e vem o terceiro aí. Na minha família poucos queriam que eu voltasse. Meus dois filhos não queriam [Júnior e Thiago], só o Bruno queria por ser flamenguista roxo. Minha mulher não queria, a maioria dos amigos também não.
Não, foi o momento mesmo, achei que poderia dar alguma colaboração. As últimas experiências lá fora também não foram tão agradáveis. E, com a chegada do neto, quis ficar mais por aqui. Perdi muito tempo de ver meus filhos crescerem, agora quero ver os netos, são dois e vem o terceiro aí. Na minha família poucos queriam que eu voltasse. Meus dois filhos não queriam [Júnior e Thiago], só o Bruno queria por ser flamenguista roxo. Minha mulher não queria, a maioria dos amigos também não.
Ouve-se muito sobre gente de oposição e de situação atrapalhando. Você sente alguma resistência aqui dentro?
Sinto. Mas eu tomo as atitudes em prol do Flamengo. Se vai afetar ou não alguém, não me preocupo com isso. Tenho duas pessoas acima de mim para consultar, o vice-presidente [Vinícius França] e a Patrícia. O vice é meu amigo de muitos anos, temos facilidade de dialogar. E qualquer coisa eu vou direto na Patrícia e pergunto: “Olha, tem essa possibilidade, pode?” Se pode, ótimo. Se não pode, não pode. Paciência.
Sinto. Mas eu tomo as atitudes em prol do Flamengo. Se vai afetar ou não alguém, não me preocupo com isso. Tenho duas pessoas acima de mim para consultar, o vice-presidente [Vinícius França] e a Patrícia. O vice é meu amigo de muitos anos, temos facilidade de dialogar. E qualquer coisa eu vou direto na Patrícia e pergunto: “Olha, tem essa possibilidade, pode?” Se pode, ótimo. Se não pode, não pode. Paciência.
Você tem carta branca como diretor de futebol?
Tenho, para tomar decisões. Só não tenho total carta branca porque tenho que perguntar quanto há no caixa. Se eu tivesse o orçamento, não precisava perguntar, tinha só de prestar contas. A autonomia que a presidente dá para o futebol é: “Você vai escolher as pessoas que vão trabalhar contigo”. Agora, se eu escolher uma pessoa de 20 000 e ela disser que está caro, tenho que escolher uma de 10 000.
Tenho, para tomar decisões. Só não tenho total carta branca porque tenho que perguntar quanto há no caixa. Se eu tivesse o orçamento, não precisava perguntar, tinha só de prestar contas. A autonomia que a presidente dá para o futebol é: “Você vai escolher as pessoas que vão trabalhar contigo”. Agora, se eu escolher uma pessoa de 20 000 e ela disser que está caro, tenho que escolher uma de 10 000.
O dinheiro não é do Zico. O presidente da Olympikus não vem aqui e diz: “Zico, tenho 10 milhões para contratar”. O dinheiro é do Flamengo, não existe o Fla Futebol. Se eu vou contratar o Deivid ou o Diogo, digo: “O preço é esse, posso seguir?”. “Pode.” Aí contrato. Essa é a autonomia. Não sei nada sobre o contrato da Olympikus, da Batavo, nada. É tudo do Flamengo. O vice-presidente de finanças [Michel Levy] chega e fala: “Você pode gastar até tanto”. E é o que eu faço. A única coisa é que eu não digo o nome, eu escolho. Você não pode esperar que o cara da Olympikus vá bancar. Ele que contrate o jogador e coloque aqui, como faz a Unimed no Fluminense.
O que você diria para as pessoas que alegam que o dinheiro da patrocinadora existe, mas você não usa?
Dos problemas que você encontrou aqui, o caso Bruno foi o maior?
Foi o principal. Um profissional seu estar preso é ruim para todo mundo. A gente sente muito pelo próprio cara, pelo potencial dele. Ele estava sentado aí e eu aqui, dizendo que ele tinha que pensar alto, em seleção, em Copa 2014. Ele estava de bico porque o preparador de goleiros tinha saído. E eu disse: “Cara, o bom é você, não o preparador. Ele pode até ser bom, mas você vai ser bom com esse ou com aquele. Não pode estar de birrinha por isso. Quem sabe o que vem não te melhora ainda mais?” Isso já era um problema. Aí de repente o cara está preso, acusado de assassinato. Não é fácil.
Foi o principal. Um profissional seu estar preso é ruim para todo mundo. A gente sente muito pelo próprio cara, pelo potencial dele. Ele estava sentado aí e eu aqui, dizendo que ele tinha que pensar alto, em seleção, em Copa 2014. Ele estava de bico porque o preparador de goleiros tinha saído. E eu disse: “Cara, o bom é você, não o preparador. Ele pode até ser bom, mas você vai ser bom com esse ou com aquele. Não pode estar de birrinha por isso. Quem sabe o que vem não te melhora ainda mais?” Isso já era um problema. Aí de repente o cara está preso, acusado de assassinato. Não é fácil.
As saídas de Adriano e Vágner Love também foram problemas que ficaram em suas mãos.
Você perde dois ídolos, o Flamengo faz 30 gols — só eles 27. Ninguém substitui da noite para o dia caras como esses.
Você perde dois ídolos, o Flamengo faz 30 gols — só eles 27. Ninguém substitui da noite para o dia caras como esses.
As críticas às contratações do Val Baiano e do Cristian Borja são fortes. Você conversou com o Rogério sobre eles?
Antes de qualquer coisa, o responsável sou eu. Conversei diretamente com os dois e acertei. Mas lógico que converso com o treinador, isso é normal, tomo informações. Fiquei afastado do Brasil por muito tempo, não conheço bem os jogadores e todos precisam me dar um pouco mais de subsídio. Digo: “Esse aqui, posso trazer?”. “Pode.” E trago. O Adriano foi artilheiro com 19 gols no Flamengo [pelo Brasileiro], o Val fez 18 no Grêmio Barueri [hoje Grêmio Prudente]. De uma hora para outra o cara desaprende a fazer gol?
Antes de qualquer coisa, o responsável sou eu. Conversei diretamente com os dois e acertei. Mas lógico que converso com o treinador, isso é normal, tomo informações. Fiquei afastado do Brasil por muito tempo, não conheço bem os jogadores e todos precisam me dar um pouco mais de subsídio. Digo: “Esse aqui, posso trazer?”. “Pode.” E trago. O Adriano foi artilheiro com 19 gols no Flamengo [pelo Brasileiro], o Val fez 18 no Grêmio Barueri [hoje Grêmio Prudente]. De uma hora para outra o cara desaprende a fazer gol?
Então o que aconteceu com o Val Baiano?
O que aconteceu foi o que é um grande problema do jogador brasileiro. Se ele não estiver sendo utilizado, relaxa. Aí aparece uma proposta e o cara diz: “Preciso de duas, três semanas para trabalhar”, pois não joga, não se cuida. O profissional tem que se cuidar sempre, jogando ou não. E o que aconteceu? Fiquei preocupado. Como ele não podia jogar, falei pra ele: “Tem que trabalhar por causa do peso”. Passou. Veio o período de ele estrear e não estava legal. E também foi obrigado a entrar antes do tempo e carregar o peso da saída dos dois.
O que aconteceu foi o que é um grande problema do jogador brasileiro. Se ele não estiver sendo utilizado, relaxa. Aí aparece uma proposta e o cara diz: “Preciso de duas, três semanas para trabalhar”, pois não joga, não se cuida. O profissional tem que se cuidar sempre, jogando ou não. E o que aconteceu? Fiquei preocupado. Como ele não podia jogar, falei pra ele: “Tem que trabalhar por causa do peso”. Passou. Veio o período de ele estrear e não estava legal. E também foi obrigado a entrar antes do tempo e carregar o peso da saída dos dois.
Isso foi o pior. O Flamengo se planejou só para a Libertadores. Acabou a Libertadores, acabava tudo! Todo mundo sabia que o Adriano não ia ficar, que o Love não ia ficar, que Dênis Marques, Gil, Fabiano Oliveira e Bruno Mezenga não iam ficar. São seis. Sabe quem tinha? O Diego Maurício nos juniores e o Paulo Sérgio treinando separado no Ninho do Urubu. Aí o Rogério preparou o Vinícius Pacheco [do meio para o ataque], veio o Borja, e o Paulo Sérgio disse: “Quero ir pra Portugal.” Já estava tudo certo para ele ir.
O Flamengo sabia que perderia Love e Adriano. Por que não correu logo atrás de reforços?
Então foi erro de quem estava antes, não ter planejado nada?
Não estão nem aí para pensar. É o tal negócio: não tinha opção de comprar ninguém, de ficar com esses caras. Esse menino, Thiago Sales [zagueiro que foi para o Fluminense], é brincadeira o que ele está fazendo. No ano passado mandaram ele para o Chipre emprestado de graça. Chegou e veio falar comigo. Eu disse: “Tu é o sexto cara da lista do Rogério”. Ele respondeu: “Ah, mas eu estou disposto a ficar”. Eu disse: “Está disposto? Então tá bom. Vamos renovar teu contrato”. Ficou um mês treinando e já devia estar com tudo acertado. E se negou. Hoje diz que ninguém o procurou. Ele sentou aqui comigo para renovar! Falei três vezes com ele: “Manda seu procurador aqui para renovar o contrato”. O [procurador] Léo Rabelo disse que o que estava escrito no contrato era absurdo. E eu disse: “Se é absurdo, você espera e leva ele embora, eu não vou brigar com você”. Agora não vem dizer que ninguém do Flamengo o procurou. Aí vai pra imprensa e fala isso. É o futebol que estamos enfrentando.
Não estão nem aí para pensar. É o tal negócio: não tinha opção de comprar ninguém, de ficar com esses caras. Esse menino, Thiago Sales [zagueiro que foi para o Fluminense], é brincadeira o que ele está fazendo. No ano passado mandaram ele para o Chipre emprestado de graça. Chegou e veio falar comigo. Eu disse: “Tu é o sexto cara da lista do Rogério”. Ele respondeu: “Ah, mas eu estou disposto a ficar”. Eu disse: “Está disposto? Então tá bom. Vamos renovar teu contrato”. Ficou um mês treinando e já devia estar com tudo acertado. E se negou. Hoje diz que ninguém o procurou. Ele sentou aqui comigo para renovar! Falei três vezes com ele: “Manda seu procurador aqui para renovar o contrato”. O [procurador] Léo Rabelo disse que o que estava escrito no contrato era absurdo. E eu disse: “Se é absurdo, você espera e leva ele embora, eu não vou brigar com você”. Agora não vem dizer que ninguém do Flamengo o procurou. Aí vai pra imprensa e fala isso. É o futebol que estamos enfrentando.
É possível garantir o Silas?
A demissão do treinador não se dá só por resultados, é algo que se sente no dia a dia, é o desgaste com o jogador, as informações que não estão sendo mais obedecidas. A pressão da torcida é na base da unanimidade, você vai ao jogo e ouve, vai a outro local e falam, e em outro e outro. Você passa e ouve: “Quando você vai tirar aquele cara?”
A demissão do treinador não se dá só por resultados, é algo que se sente no dia a dia, é o desgaste com o jogador, as informações que não estão sendo mais obedecidas. A pressão da torcida é na base da unanimidade, você vai ao jogo e ouve, vai a outro local e falam, e em outro e outro. Você passa e ouve: “Quando você vai tirar aquele cara?”
Foi assim com o Rogério?
Infelizmente. Era todo mundo, não só um que falava, e não foi de agora. Chegou um momento em que eu comecei a ver que ele estava lendo muita coisa da imprensa, se preocupando demais com isso, e estava afetando o trabalho dele no dia a dia, o relacionamento não era o mesmo com o elenco. Talvez o grupo não tivesse a confiança adequada. E, no dia seguinte à saída dele, vejo uma manchete: “Jogadores fazem churrasco pela saída do treinador”. Eu cobrei isso deles, pois isso aí se chama X-9. Não que o jogador vá falar diretamente com o jornalista, mas ele fala com o empresário, com o assessor, que dá um toque no repórter. Coisas de vestiário retratadas publicamente são um sinal de que foi jogador que falou. Isso não é legal para ninguém.
Infelizmente. Era todo mundo, não só um que falava, e não foi de agora. Chegou um momento em que eu comecei a ver que ele estava lendo muita coisa da imprensa, se preocupando demais com isso, e estava afetando o trabalho dele no dia a dia, o relacionamento não era o mesmo com o elenco. Talvez o grupo não tivesse a confiança adequada. E, no dia seguinte à saída dele, vejo uma manchete: “Jogadores fazem churrasco pela saída do treinador”. Eu cobrei isso deles, pois isso aí se chama X-9. Não que o jogador vá falar diretamente com o jornalista, mas ele fala com o empresário, com o assessor, que dá um toque no repórter. Coisas de vestiário retratadas publicamente são um sinal de que foi jogador que falou. Isso não é legal para ninguém.
O rebaixamento te preocupa neste Brasileirão?
Não, mas o perigo existe. Em um campeonato como esse, o mais difícil do mundo, você pode ser campeão e rebaixado. Não tem uma pedreira aqui e uma lá na frente, tem dez seguidas.
Não, mas o perigo existe. Em um campeonato como esse, o mais difícil do mundo, você pode ser campeão e rebaixado. Não tem uma pedreira aqui e uma lá na frente, tem dez seguidas.
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