FILMAGENS Do documentário na Fazenda Castanhão, em Nova Jaguaribara. Equipe vivenciou enredo FOTO: DIVULGAÇÃO |
Fortaleza "Rapaz, bote um cavalo aqui agora que eu corro atrás de boi. Ontem mesmo sonhei que selava um cavalo pra ir atrás de um". Os quase 100 anos e as sequelas de uma vida de agruras não arrefeceram em Zé das Araras o gosto pela vida de correr atrás de boi. O vaqueiro de Nova Jaguaribara perdeu parte de um dedo e o movimento de outro, mas ainda sonha com caatingas e reses ariscas. Este e outros depoimentos fazem parte do documentário "Charqueadas", que será lançado no próximo dia 3 de maio, no Centro Cultural Oboé, em Fortaleza.
O início das filmagens foi tema de matéria exclusiva do Caderno Regional, no dia 16 de janeiro. Agora a equipe está finalizando a edição do material, que retrata uma das principais rotas do charque do Ceará, seguindo o curso dos rios Salgado e Jaguaribe. O diretor do documentário, Roberto Bomfim, optou por vivenciar "na pele" o cotidiano dos vaqueiros, fazendo partes da travessia a cavalo. "Em alguns momentos, por conta das condições das estradas e passagens molhadas, nós que íamos a cavalo conseguíamos chegar primeiro que os carros", recorda o diretor.
Declínio
A ideia original era que o documentário também tivesse cenas em Pelotas (RS). Foi para lá que o charqueador português José Pinto Martins, inicialmente instalado em Aracati, se mudou para fugir da grande seca de 1777. Pinto Martins levou a técnica da salga da carne para aquela região. As variações climáticas e a concorrência com o produto do Sul provocaram o declínio da primeira atividade econômica cearense.
"Se conseguirmos verba para lançar o documentário na Europa, vamos nos deslocar para Pelotas e fazer uma segunda versão do documentário. Acho muito importante incluir Pelotas, não apenas para mostrar como foi o declínio da charqueada no Ceará, mas também mostrar as similitudes entre o gaúcho e o nosso vaqueiro. Pessoas muito ligadas à terra, bairristas, valentes, enfrentando condições extremas", afirma Roberto Bomfim.
Aos depoimentos de historiadores e memorialistas, que fazem um balanço do impacto da pecuária extensiva e das oficinas de charque para a ocupação do interior cearense, somam-se as recordações e vivências de vaqueiros, ribeirinhos, comerciantes e fazendeiros no caminho entre Icó e Aracati. Pessoas que testemunham um mundo em plena transformação com a tecnologia e as "modas" da juventude. Roberto Bomfim diz que muitos lamentam o fato de os filhos e netos não seguirem a atividade, que aos poucos está se perdendo.
A equipe ainda está procurando apoios para fazer o lançamento do documentário nas cidades por onde a expedição passou, como forma de agradecer toda a disponibilidade que encontraram pelo caminho. "O que mais me marcou foi a pureza e a simplicidade desse povo. Depois de fazer esse documentário, eu me sinto mais cearense do que nunca. São pessoas que abrem as portas das suas casas, nos ajudaram em tudo que fosse possível. Nunca vou me esquecer do tambaqui de cinco quilos que o seu Luís, fazendeiro que vive a 25km de Icó, mandou fazer cozido no leite. Gostaria que todo cearense se dispusesse a fazer uma aventura", finaliza.
Hipótese
A charqueada foi o primeira atividade econômica de relevo no Ceará. Não existe um consenso sobre quem teria trazido a técnica da charqueada ou se ela foi desenvolvida na própria capitania. O pesquisador Geraldo Nobre, no livro "As Oficinas das Carnes do Ceará" (1977), levanta a hipótese de a charqueada ter sido trazida pelos descendentes do holandês Joris Garstman, que comandava o forte dos Reis Magos (RN). Eles teriam ocupado a ribeira do Jaguaribe e de lá espalhado a técnica. O fato é que as oficinas aqui encontraram um ambiente propício. O vento constante, a baixa umidade do ar e o acesso a fontes salinas permitiam a boa secagem do produto.
Os portos eram privilegiados pela proximidade dos pontos consumidores. Com o declínio da carne do Ceará por conta das secas e da concorrência com o charque do Sul, deu-se início ao ciclo do algodão.
MAIS INFORMAÇÕES
Lançamento do documentário "Charqueadas", Dia 3 de maio, às 19h30, Centro Cultural Oboé (Rua Maria Tomásia, 531, Aldeota - Fortaleza)
Karoline Viana
Repórter
Declínio
A ideia original era que o documentário também tivesse cenas em Pelotas (RS). Foi para lá que o charqueador português José Pinto Martins, inicialmente instalado em Aracati, se mudou para fugir da grande seca de 1777. Pinto Martins levou a técnica da salga da carne para aquela região. As variações climáticas e a concorrência com o produto do Sul provocaram o declínio da primeira atividade econômica cearense.
"Se conseguirmos verba para lançar o documentário na Europa, vamos nos deslocar para Pelotas e fazer uma segunda versão do documentário. Acho muito importante incluir Pelotas, não apenas para mostrar como foi o declínio da charqueada no Ceará, mas também mostrar as similitudes entre o gaúcho e o nosso vaqueiro. Pessoas muito ligadas à terra, bairristas, valentes, enfrentando condições extremas", afirma Roberto Bomfim.
Aos depoimentos de historiadores e memorialistas, que fazem um balanço do impacto da pecuária extensiva e das oficinas de charque para a ocupação do interior cearense, somam-se as recordações e vivências de vaqueiros, ribeirinhos, comerciantes e fazendeiros no caminho entre Icó e Aracati. Pessoas que testemunham um mundo em plena transformação com a tecnologia e as "modas" da juventude. Roberto Bomfim diz que muitos lamentam o fato de os filhos e netos não seguirem a atividade, que aos poucos está se perdendo.
A equipe ainda está procurando apoios para fazer o lançamento do documentário nas cidades por onde a expedição passou, como forma de agradecer toda a disponibilidade que encontraram pelo caminho. "O que mais me marcou foi a pureza e a simplicidade desse povo. Depois de fazer esse documentário, eu me sinto mais cearense do que nunca. São pessoas que abrem as portas das suas casas, nos ajudaram em tudo que fosse possível. Nunca vou me esquecer do tambaqui de cinco quilos que o seu Luís, fazendeiro que vive a 25km de Icó, mandou fazer cozido no leite. Gostaria que todo cearense se dispusesse a fazer uma aventura", finaliza.
Hipótese
A charqueada foi o primeira atividade econômica de relevo no Ceará. Não existe um consenso sobre quem teria trazido a técnica da charqueada ou se ela foi desenvolvida na própria capitania. O pesquisador Geraldo Nobre, no livro "As Oficinas das Carnes do Ceará" (1977), levanta a hipótese de a charqueada ter sido trazida pelos descendentes do holandês Joris Garstman, que comandava o forte dos Reis Magos (RN). Eles teriam ocupado a ribeira do Jaguaribe e de lá espalhado a técnica. O fato é que as oficinas aqui encontraram um ambiente propício. O vento constante, a baixa umidade do ar e o acesso a fontes salinas permitiam a boa secagem do produto.
Os portos eram privilegiados pela proximidade dos pontos consumidores. Com o declínio da carne do Ceará por conta das secas e da concorrência com o charque do Sul, deu-se início ao ciclo do algodão.
MAIS INFORMAÇÕES
Lançamento do documentário "Charqueadas", Dia 3 de maio, às 19h30, Centro Cultural Oboé (Rua Maria Tomásia, 531, Aldeota - Fortaleza)
Karoline Viana
Repórter
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